Título: FONTELES VAI PROPOR PROJETO CONTRA IMPUNIDADE
Autor: Jailton de Carvalho e Carolina Brígido
Fonte: O Globo, 02/04/2005, O País, p. 8

Proposta é simplificar processos envolvendo procuradores e ampliar prazos de prescrição dos crimes

BRASÍLIA. Numa tentativa de pôr fim à impunidade de procuradores acusados de cometer irregularidades, o procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, enviará ao Congresso Nacional um projeto de modernização da Lei Orgânica do Ministério Público. A proposta, que está em fase final de elaboração e será remetida ao Legislativo até junho, prevê a simplificação dos processos contra procuradores e a ampliação dos prazos de prescrição dos crimes. Hoje, com investigações longas e prazos prescricionais exageradamente curtos, os procuradores estão praticamente a salvo de punições rigorosas.

Crimes prescrevem antes da conclusão dos processos

Desde que foi criado no início da década de 90, não há registro de procurador ou subprocurador-geral da República que tenha perdido o cargo em conseqüência de processo aberto no Conselho Superior do Ministério Público. Segundo relato de integrantes do próprio conselho, em geral os crimes prescrevem antes da conclusão dos processos, mesmo quando as irregularidades investigadas são consideradas de alta gravidade.

Pela proposta de Fonteles, caberá ao Conselho Superior, composto por dez subprocuradores-gerais, deliberar sobre o resultado de investigações conduzidas em sindicância e inquérito no âmbito da Corregedoria-Geral. Hoje, as investigações de sindicâncias e inquéritos da corregedoria são praticamente reproduzidas no Conselho Superior. Em linhas gerais, qualquer desvio ou crime deve ser apurado pelo menos quatro vezes antes de qualquer sentença.

O procurador-geral também vai recomendar que os prazos de prescrição dos crimes sejam dobrados. Hoje, os crimes prescrevem em um, dois e quatro anos, de acordo com a pena, que vai da simples advertência à demissão. Pelo nova proposta, estes prazos seriam ampliados para três, quatro e oito anos.

¿ São mudanças que, juntas, terão repercussão no final dos processos ¿ afirmou o corregedor-geral, Wagner Gonçalves.

O corregedor também deverá propor medidas que garantam a transparência das decisões do Conselho Superior. Muitos procuradores da República têm fama de protagonizar ruidosas investigações sobre políticos, empresários e celebridades. Mas, quando as investigações dizem respeito a colegas, as regras são diferentes. As sessões em que o Conselho Superior delibera sobre processos contra integrantes do Ministério Público são sigilosas.

A Procuradoria da República não informa nem mesmo quais são os casos em tramitação no conselho. A abertura começou ano passado com um despacho de Gonçalves favorável ao ex-secretário-geral da Presidência Eduardo Jorge. O ex-secretário-geral pediu e teve acesso a um processo que moveu contra o procurador regional da República Luiz Francisco. A partir daí, qualquer uma das partes envolvidas no processo, pode pedir cópia das deliberações do Conselho.

Regras perderam sentido com a redemocratização

Até então, informações dessa natureza eram uma prerrogativa dos integrantes do Conselho e do procurador ou subprocurador investigado. Procuradores e subprocuradores são unânimes em criticar o corporativismo implícito nas normas de funcionamento do Conselho Superior do Ministério Público. As regras, criadas com o propósito exclusivo de proteger procuradores de vinganças de políticos corruptos e influentes durante o regime militar, perderam o sentido com o avanço da redemocratização.