Título: TODAS AS VOZES SE UNEM CONTRA O MASSACRE
Autor: Gustavo Goulart
Fonte: O Globo, 02/04/2005, Rio, p. 14
Autoridades, especialistas e vítimas da violência reagem com indignação aos assassinatos
RIO e BRASÍLIA. A indignação com o massacre na Baixada Fluminense uniu defensores dos direitos humanos, parentes de vítimas de outras chacinas, estudiosos da violência e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em nota divulgada na noite de ontem pelo Palácio do Planalto, o presidente diz que recebeu com revolta à notícia da chacina. Lula diz ainda que o governo federal ¿não poupará esforços para, em conjunto com as autoridades estaduais e municipais, encontrar e punir os responsáveis por esse crime bárbaro e covarde¿.
O pesquisador Marcelo Freixo, da ONG Justiça Global, informou que vai enviar relatório sobre a chacina ao relator de execuções sumárias da ONU, Philip Alston, e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, da OEA.
O sociólogo Rubem Cesar Fernandes, coordenador do Viva Rio, concorda: para ele, com a chacina, os bandidos tentaram mandar um recado para o poder público. Para ele, fica claro um descontentamento desse grupo, que precisa ser identificado com urgência.
O procurador-geral de Justiça, Marfan Viera, disse que o Ministério Público irá acompanhar a investigação da polícia:
¿ Os crimes revelam covardia e total desprezo pela vida humana ¿ afirmou ele.
O presidente da OAB-RJ, Octávio Gomes, determinou que a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da entidade acompanhe o trabalho das autoridades e dê assistência aos parentes das vítimas.
A coordenadora do grupo Tortura Nunca Mais, Cecília Coimbra, disse que a impunidade, principalmente aos torturadores, agrava ainda mais o quadro de violência:
¿ Nenhum torturador foi punido nesse país. A impunidade aduba novas violações dos Direitos Humanos.
A artista plástica Yvone Bezerra de Mello, que trabalha com 320 crianças carentes e ajudou os sobreviventes da Chacina da Candelária, também é testemunha de tragédias cotidianas, na Favela da Maré.
¿ As chacinas da Candelária e de Vigário Geral acontecem todos os dias em vários lugares da cidade ¿ disse.
¿Esses fantasmas podem sempre ressurgir¿
A coordenadora da área de criminalidade e violência do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes (Cesec/Ucam), Leonarda Musumeci, disse que a degradação tomou conta das instituições de segurança:
¿ Como a situação da segurança não melhorou, não houve uma mudança radical nas instituições, no enfrentamento do problema, então esses fantasmas podem sempre ressurgir.
A dona-de-casa Euristéia Santana de Azevedo, presidente do grupo Mães do Rio, perdeu o filho de 24 anos, há sete anos, segundo ela, assassinado por PMs depois de uma discussão em São Cristóvão. No grupo de Euristéia, há 308 mães que perderam os filhos vítimas de violência. Ela chegou a pensar em ir ao enterro das vítimas da chacina na Baixada Fluminense, mas desistiu com medo de ser perseguida por policiais.
Quinze anos depois de ter o filho desaparecido em Acari, junto com outros 11 jovens, Marilene Lima de Souza lembrou de sua tragédia pessoal:
¿ Lutando há tanto tempo, não consigo entender como isso ainda acontece.