Título: Outros documentos secretos
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 03/04/2005, Panorama Político, p. 2

O procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, quer pôr as mãos em 32 caixas de documentos sobre a remessa ilegal de divisas enviadas pelos procuradores americanos. Elas chegaram ao Senado em 27 de dezembro passado, depois que o relator e o presidente da CPI do Banestado, deputado José Mentor e senador Antero Paes de Barros, respectivamente, encaminharam, cada qual, ao Ministério Público, seus relatórios que não chegaram a ser votados.

Na quinta-feira o presidente do Senado, Renan Calheiros, entendeu que estava numa saia justa ao receber o pedido do procurador. Se concordar com a entrega estará não apenas contribuindo para a reabertura de uma investigação que pode fazer explodir bombas de efeito retardado. Estará entregando ao Ministério Público as chaves de duas salas que vivem trancadas, uma na Câmara e outra no Senado. Nelas estão guardadas pilhas de documentos de CPIs passadas, que não foram encaminhados à Justiça porque não chegaram a ser examinados ou porque as investigações não foram concluídas.

Renan pediu o parecer dos consultores jurídicos do Senado, que examinavam na sexta-feira três alternativas: a simples recusa, alegando vedação constitucional; a desculpa de que os relatórios já foram encaminhados; ou o encaminhamento da matéria ao exame da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Diante da recusa, Fonteles pode recorrer ao STF e obter aí as chaves que procura. A desculpa de que os relatórios já foram enviados não engolirá. Sabe que dois dias depois disso chegaram as 32 caixas que nunca foram abertas. Contêm documentos obtidos junto aos bancos americanos pelos procuradores que firmaram um acordo de cooperação com os colegas brasileiros. Eles podem complicar a vida de muita gente importante que ficou fora dos relatórios.

No ano passado, na CCJ da Câmara, houve uma disputa entre seu então presidente, Luiz Eduardo Greenhalgh, e o deputado Sergio Miranda, que defendeu projeto pedindo a abertura desses documentos secretos a quem quisesse pesquisá-los, inclusive os procuradores. Greenhalgh invocou o artigo 58 da Constituição, que prevê o envio à Justiça das conclusões das CPIs. Das conclusões e não dos documentos em que se basearam as investigações. O que Renan decidir sobre o pedido de Fonteles abrirá o precedente sobre o destino deste tipo de documento, tanto os estocados como os que venham a ser obtidos por futuras CPIs.

Fonteles, que vem marcando sua atuação pela independência, já avisou a Lula que não quer um segundo mandato. O atual termina em junho e ele parece estar dourando o fecho. Examina a possibilidade de enviar ao Supremo, ainda esta semana, um pedido de abertura de inquérito contra o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, proposto por outros procuradores. A acusação, manter no exterior recursos que não teriam sido declarados ao Fisco. Tudo isso já foi divulgado e muito explorado pela oposição no ano passado, durante as investigações da mesma CPI do Banestado. A novidade é o pedido de abertura de inquérito junto ao STF, foro privilegiado dos ministros de Estado, título que foi dado a Meirelles exatamente para defendê-lo das investidas de algum juiz de primeira instância. Este processo já está instruído. Não é o nome de Meirelles que Fonteles espera encontrar nas caixas americanas.