Título: DOR DO PONTÍFICE MOTIVA FIÉIS NOS ESTADOS UNIDOS
Autor:
Fonte: O Globo, 02/04/2005, Economia, p. 35

Cardeal: `Ele ensinou que aflição tem valor¿

Lágrimas brotaram nos olhos de Jim Bradshaw esta semana quando ele via no noticiário na TV um alquebrado Papa João Paulo II desistindo de sua tentativa de dar uma bênção depois de não conseguir mais do que emitir alguns sons ininteligíveis. Essa imagem de determinação e fracasso imediatamente fez com que esse morador de Arlington de 63 anos caísse de joelhos em orações fervorosas. Naquele momento, disse Bradshaw, ele sentiu algo tão impensável quanto claro: o fim está próximo.

Walter Johnson e outros fiéis rezavam pela saúde do Papa João Paulo II numa missa na Catedral de St. Thomas More, em Arlington.

¿ Sabemos que ele está sofrendo ¿ disse Bradshaw, chorando baixinho. ¿ Estamos todos rezando porque sentimos e nos identificamos com ele e vemos que é bem verdade que o sofrimento é parte da condição humana ¿ disse.

Preocupação com rumos futuros da Igreja

Por quase três décadas, o Papa tem sido uma figura de enorme projeção, ganhando corações com seu carisma e suas aparições públicas e viagens. Com o seu líder atravessando a pior crise de saúde de sua vida, os católicos americanos reagem com pesar e se preocupam com os rumos da Igreja. Uns poucos questionaram se o Pontífice deveria continuar no leme, estando como está. Mas a maioria demonstrou seu senso de conexão com este Papa, descrevendo como ele os inspirou por sua compaixão e como se tornou acessível ao católico comum.

Discordância e admiração ao mesmo tempo

Mesmo os que se opõem a muitos de seus ensinamentos conservadores se emocionaram com sua determinação. Frances Kissling, presidente do grupo Católicos por uma Livre Escolha, disse ter passado boa parte dos últimos anos lutando contra as diretrizes papais sobre aborto e contracepção.

¿ Discordo dele, mas a coisa é diferente agora ¿ afirmou ela. ¿ Pessoalmente, considero sua saúde debilitada e seu sofrimento uma inspiração. Todos pensamos sobre o que significa viver em sofrimento.

Loni Ellis, de 60 anos, funcionária de um escritório de advocacia, discorda dos ¿ensinamentos ortodoxos¿ do Papa sobre temas sociais como aborto, homossexualismo e contracepção, mas ainda assim admira o Pontífice.

¿ Ele é tão perfeito espiritualmente como é possível a um mortal ser. Ele deve ser a pessoa mais santa viva ¿ comentou.

O cardeal Theodore McCarrick, de Washington, disse que a frustração do Papa por sua incapacidade de falar é uma indicação de seu sofrimento. Mas o Papa sempre ensinou que tal aflição tem valor, disse ele.