Título: DO ARMÁRIO PARA A RUA, SEM MEDO DE SER FELIZ
Autor: Adriana Castelo Branco
Fonte: O Globo, 03/04/2005, Rio, p. 31

Sucesso de gay assumido na TV chama a atenção para uma turma que já não tem vergonha de mostrar a cara

Os gays estão saindo do armário para ir a shoppings, restaurantes e cinemas como qualquer casal, com direito a troca de carinhos em público. A vitória do baiano Jean Wyllys, homossexual assumido, no ¿Big Brother¿, na última terça-feira, fez essa turma que ousa dizer seu nome ganhar ainda mais visibilidade. Pudera: ela é cada vez mais numerosa. Cláudio Nascimento, presidente do Grupo Arco-Íris, estima que 15% da população do Rio, cerca de 900 mil pessoas, são homossexuais.

¿ Não tinha idéia de como a minha vitória seria tão positiva para o movimento gay. Considero a orientação sexual determinante mas, ao mesmo tempo, apenas um componente na vida das pessoas. Mesmo assim, não dá para negar que o fato de eu ter assumido deu combustão à luta ¿ diz Wyllys.

Rio terá cinco paradas do Orgulho Gay este ano

Luta que ganha cada vez mais as ruas. Segundo Cláudio Nascimento, este ano pela primeira vez serão realizadas cinco paradas do Orgulho Gay no Rio ¿ somente na de Copacabana, em junho, é esperado um milhão de pessoas.

¿ É importante reconhecer que o tema está sendo debatido mais do que nunca. Finalmente chegou a hora de os homossexuais não precisarem mais programar seu afeto. Lugares não faltam ¿ comemora Nascimento.

Um desses lugares ¿ o restaurante Chez Pierre, considerado gay friendly (simpatizante) tanto quanto o hotel que o abriga, o Ipanema Plaza ¿ passou a realizar todo sábado, a pedido dos clientes (entre eles muitos heterossexuais), a feijoada criada para homenagear o movimento GLS no carnaval deste ano. O chef da casa, Écio Cordeiro de Mello, diz orgulhoso que hoje costuma conversar sobre sua homossexualidade até com a avó. E comenta, mais orgulhoso ainda, que já é comum ver casais do mesmo sexo de mãos dadas voltando da praia pela Farme de Amoedo.

¿ A idéia do Chez Pierre era ser mais um lugar voltado para o público GLS. Mas hoje a casa é freqüentada muito mais por simpatizantes. A aceitação é geral ¿ garante Écio, que também comanda uma empresa de eventos gastronômicos.

Juntos há 13 anos, os estilistas da grife Sta. Ephigênia, Marco Maia e Luciano Canale, assinam embaixo. Na opinião de Canale, os gays hoje têm um espaço grande na mídia, nas novelas e nos seriados de TV, o que colabora para uma abertura também maior da sociedade.

¿ Felizmente, o estereótipo do gay afetado já faz parte do passado. E o fato de o Jean ter ganho só reforça que homossexuais são pessoas normais, que podem, sim, ser bem-intencionadas, cultas, humanas. Aliás, as pessoas hoje buscam esses atributos, e ser gay é o que menos importa ¿ diz Canale.

Segundo o deputado estadual Carlos Minc, árduo defensor da causa, há hoje no Brasil uma frente parlamentar que luta pela livre expressão sexual. Autor do projeto que proíbe e pune com multa a discriminação contra homossexuais e co-autor da lei que reconhece, para efeito de pensão, companheiros do mesmo sexo de funcionários públicos estaduais falecidos, Minc hoje luta pelo pagamento do direito previdenciário a pelo menos 50 viúvos e viúvas gays.

¿ Um hotel em Niterói barrou um casal de homens e teve que pagar multa e dar duas diárias a eles. Há algum tempo isso seria impensável ¿ conta o deputado.

O estilista Carlos Tufvesson também faz a sua parte para ajudar a diminuir o preconceito. Casado há dez anos com o arquiteto André Piva, ele construiu uma casa com o companheiro e nunca deixou de manifestar seu carinho em público.

¿ Ao longo desse tempo, dei minha cara a tapa para ajudar a acabar com o estereótipo negativo. Hoje já existe um reconhecimento da sociedade, mas sonho com o dia que meu estado de cônjuge seja reconhecido ¿ diz o estilista.

Tufvesson não é o único a ter esse ideal, por enquanto ainda imaginário. Vivendo junto com o designer Jorge Luis Rodrigues há 25 anos, John Mccarthy, diretor do curso de inglês Brasas, afirma que seu maior desejo é oficializar a união. Morando em um condomínio de classe média em Jacarepaguá, ele conta que os vizinhos atualmente sabem que eles formam um casal. John, aliás, integra o conselho fiscal do condomínio e tem apartamento e seguro de vida junto com o parceiro.

¿ Se a nossa união fosse oficial, o Jorge poderia ser meu dependente no plano de saúde, por exemplo ¿ analisa Mccarthy.