Título: Matador é reconhecido
Autor: Célia Costa e Vera Araújo
Fonte: O Globo, 05/04/2005, Rio, p. 12

Testemunha identifica soldado da PM como um dos assassinos de 30 pessoas

Uma das testemunhas da chacina de 30 pessoas ocorrida semana passada na Baixada Fluminense reconheceu ontem o soldado Carlos Jorge Carvalho, do 20º BPM (Mesquita), como um dos assassinos. O policial seria, segundo informações da Secretaria de Segurança, uma das pessoas que atiraram nas vítimas na Rua Gama, no bairro da Posse, em Nova Iguaçu. Ele foi autuado por receptação porque em sua casa foi encontrado um carro roubado. Outros dois policiais já tinham sido reconhecidos como os homens que, depois da chacina, voltaram para recolher os cartuchos espalhados no chão. Carvalho está detido administrativamente. Até agora, há cinco policiais presos por ordem judicial e outros sete administrativamente pela PM.

A Polícia Federal, que também investiga o caso, prendeu ontem mais dois policiais militares suspeitos de participação na chacina. Um deles, o soldado Julio César do Amaral de Paula, de 33 anos, lotado no Grupamento Especial Tático-Móvel (Getam) do Comando de Policiamento da Baixada (CPB), entregou-se à tarde no 20º BPM (Mesquita). Havia um mandado de prisão contra ele solicitado pela PF. O outro preso é o soldado Maurício Jorge da Matta Montezano, de 33 anos, do 24º BPM (Queimados). Tanto Júlio, que seria um dos chefes do massacre, como Maurício foram reconhecidos por testemunhas da chacina. A PF já prendeu quatro policiais (um deles é José Augusto Moreira Felipe, investigado pela Polícia Civil) e apreendeu três carros: um Vectra, um Gol e um Audi, que teriam sido usados pelos criminosos.

O chefe de Polícia Civil, delegado Álvaro Lins, informou ontem que parte dos PMs presos estava sendo investigada desde o ano passado pela Corregedoria da PM por suspeita de participação em seqüestros, envolvimento com grupos de extermínio e roubo. A maioria seria lotada no 24º BPM (Queimados).

Álvaro Lins reafirmou que a principal linha de investigação ainda é a de que a chacina aconteceu em represália à linha dura imposta pelo comando dos batalhões dentro da operação Navalha na Carne, que tem o objetivo de punir policiais por desvio de conduta. Ontem, a Polícia Civil localizou uma testemunha que viu quando PMs seqüestraram um homem que teve a cabeça cortada e jogada no pátio do 15º BPM (Caxias), na semana passada. O crime teria sido cometido pelos policiais em reação ao rigor disciplinar do comando do batalhão. A pessoa está sob proteção policial e, a exemplo das testemunhas da chacina, deve ser levada à Justiça para a produção de provas.

Armas e munição são apreendidas

Cumprindo dois mandados, policiais apreenderam armas, carro roubado, algemas e vasta munição calibres 380 e .40 em seis endereços de três policiais militares que estão presos, por suspeita de terem participado da chacina ocorrida na última quinta-feira, em Nova Iguaçu e Queimados. Foram encontradas também jóias e roupas sujas de sangue. Caso seja sangue humano, a polícia fará exame de DNA para saber se é de alguma das vítimas.

A polícia vai investigar se as jóias encontradas com os policiais pertencem à vendedora Mara Valéria Bittencourt Moreira, de 40 anos. Ela é mulher do ex-vereador de Mesquita José Rechuem e desapareceu há quatro meses, juntamente com o seu filho, Enil Fagundes Neto, que é enteado do ex-vereador. Entre as jóias, foi encontrado um relógio do mesmo modelo que, segundo o marido, Mara vendia.

Nos endereços dos policiais militares foram encontrados dois carros: um Gol preto com placa clonada, chassi e vidros de veículos diferentes e um outro carro que ainda está sendo investigado. O material apreendido foi levado para a Delegacia de Homicídios da Baixada, onde policiais prestaram depoimento durante o dia de ontem. No material apreendido foram encontrados ainda um colete da Polícia Ferroviária e uma placa de motocicleta.

O coronel João Carlos Ferreira, inspetor-geral da Secretaria de Segurança Pública, não quis dar detalhes das apreensões realizadas ontem e disse que espera ajuda de outras testemunhas na investigação.

¿ Foi uma barbárie nunca vista em nosso estado. É necessário sigilo nas investigações ¿ disse João Carlos. ¿ Certamente em algum momento esse grupo se reuniu para praticar os crimes e alguém deve ter visto. Seja quando eles se reuniram, seja quando se dispersaram.