Título: CARDEAIS BRASILEIROS FALAM DE QUALIDADES DO SUCESSOR
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Fonte: O Globo, 04/04/2005, Especial, p. 2

Presidente da CNBB diz já ter nome em mente. Quatro representantes do Brasil têm direito a voto

Opresidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), Dom Geraldo Majella Agnelo, viaja hoje para Roma, para participar das homenagens póstumas a João Paulo II e do conclave que elegerá o novo Papa. Embora não o revele, ele leva em mente um nome da sua preferência.

¿ Não se pode votar em si mesmo, mas existem pessoas que eu penso que podem agir de acordo com o que se espera de um Papa. Mas não posso revelar o nome ¿ disse ontem, em Salvador.

O cardeal-arcebispo emérito da arquidiocese do Rio, Dom Eugenio Sales, disse acreditar que o próximo conclave será rápido.

¿ Eu espero um conclave rápido, pois hoje a comunicação entre os cardeais é constante ¿ declarou.

Dom Eugenio comentou as declarações feitas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando disse torcer para que o próximo Papa fosse brasileiro. Dom Eugenio disse que não torce por isso, mas ficará feliz caso o sonho do presidente Lula se realize.

¿ Se for uma pessoa que eu conheço, daqui, há um superávit de alegria. Mas eu procuro não viver essa expectativa ¿ disse o cardeal.

No sábado à noite, poucas horas após o falecimento de João Paulo II, Lula havia feito sua defesa da candidatura de um Papa brasileiro.

¿ Sinceramente, gostaria que fosse brasileiro. Tenho amigos cardeais aqui no Brasil e eu ficaria muito feliz que um deles fosse escolhido ¿ disse Lula.

Dom Eugenio embarca para Roma amanhã, onde participará das reuniões preparatórias da sucessão. Ele, que tem 84 anos e votou nos dois últimos conclaves, não votará no próximo. Só os cardeais com até 79 anos podem votar.

Quatro brasileiros têm direito a voto neste conclave. Dom Geraldo, presidente da CNBB e cardeal-arcebispo de Salvador, é um deles. Os outros são Dom Cláudio Hummes, arcebispo de São Paulo, Dom Eusébio Oscar Scheid, arcebispo do Rio, e Dom José Freire Falcão, membro da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé.

Dom Eusébio preferiu a prudência e evitou comentários sobre suas preferências em relação ao sucessor de João Paulo II. Quando indagado sobre quais são os candidatos mais fortes para liderar a Santa Sé, ele respondeu:

¿ Não faço a menor idéia. Não tenho como prever o que vai acontecer.

O cardeal, no entanto, ressaltou algumas características que precisam fazer parte do perfil do novo Pontífice:

¿ O novo Papa, a exemplo de João Paulo II e de seus antecessores, deve ser um líder preocupado com as injustiças sociais que acontecem no mundo.

Dom Aloísio pede diálogo mais amplo

Gripado, afônico e febril, Dom Cláudio não pôde celebrar a missa na Catedral da Sé. Ele estava com passagem marcada para Roma ontem à noite, mas adiou a viagem por causa da gripe. Convidado por Lula, ele ainda não sabe se integrará a comitiva do presidente.

Segundo o presidente da CNBB, as especulações feitas no momento não têm fundamento, porque, na sua opinião, o novo Papa pode sair de qualquer parte do mundo. Para Dom Geraldo Majella, continua em vigor a máxima da Igreja segundo a qual o favorito entra Papa no conclave e sai cardeal. Ele afirma também que nunca houve um Papa que fosse a imagem e a semelhança do seu antecessor e observa que dos quase 260 papas da História da Igreja Católica, cada um teve a sua marca.

¿ O que todos tiveram em comum foi a preocupação em ser Vigário de Cristo, fazer aquilo que Cristo fez: anunciar o Evangelho e ser como um sinal para o mundo ¿ disse.

Quanto às especulações sobre a indicação de um Papa com mais de 70 anos para evitar que próximo pontificado seja tão longo, Dom Geraldo disse:

¿ Mas por que precisamos ter um Papa de transição? Podemos ter uma transição de 33 dias ou um Pontificado de cinco anos como foi de João XXIII, que marcou profundamente a vida da Igreja com o Concílio Vaticano II, de modo que transição não é solução.

O cardeal emérito de Aparecida, Dom Aloísio Lorscheider, que na escolha do último Papa foi considerado um dos favoritos, disse ontem em Porto Alegre, onde vive, que o novo Papa precisa democratizar as decisões da Igreja, ouvindo mais os bispos, e defendeu uma reunião do sucessor de João Paulo II com todos os bispos, alguns padres, religiosos e cristãos de todo o mundo, para redefinirem o papel da Igreja à luz dos problemas do mundo moderno e que, como no caso da família, requerem soluções urgentes.

¿ Seria uma reunião mais longa, um sínodo extraordinário que, além dos bispos de todo o mundo, poderia reunir alguns padres, religiosos, religiosas e mesmo cristãos leigos. Seria importante, porque temos muitos problemas que precisam de solução e o Papa sozinho não pode resolver isso, porque ele não é totalitário e a Igreja é uma comunhão e age democraticamente ¿ disse Dom Aloísio, que não irá a Roma.

Dom Aloísio entende que, num momento de transição, a escolha é delicada, especialmente quando envolve a sucessão de um pontífice que ficou praticamente 27 anos à frente da Igreja:

¿ Foi uma espécie de reinado de 27 anos, com uma marca pessoal muito forte. Ainda que digam que não haverá uma continuidade, na realidade sempre há. Uma eleição como essa sempre tem certa trepidação, porque não se sabe quem será eleito e como agirá. Mas hoje o grande ponto de referência será o Concílio Vaticano II.

O cardeal-arcebispo emérito de São Paulo, Dom Paulo Evaristo Arns, de 83 anos, que se recupera de enfarte sofrido há um mês, também não tem mais direito a voto no colégio dos cardeais. Ontem, em missa celebrada por ele em São Paulo, disse que admirava o dom da esperança do Papa João Paulo II e o seu desejo de transmitir este sentimento a todas as pessoas.