Título: PERDEU, FRAUDADOR
Autor: Chico Otavio e Toni Marques
Fonte: O Globo, 07/04/2005, O País, p. 3

Fiscais acusados de golpe contra o INSS têm 71 imóveis e 69 carros seqüestrados

AJustiça e a Polícia Federal deram ontem o primeiro passo para tentar devolver à Previdência parte dos R$3 bilhões desviados por uma quadrilha de auditores fiscais do INSS. Dos 13 acusados, 11 foram presos em fevereiro, um em março e outro ainda está foragido. Por decisão do juiz Flávio Roberto de Souza, da 3ª Vara Federal Criminal, foram bloqueados 71 imóveis, muitos deles de luxo, e 69 carros dos fiscais presos. No total, estão avaliados em R$40 milhões. Se os acusados forem condenados, os bens serão usados para ressarcir o INSS pelos prejuízos causados pelas fraudes.

Para garantir o bloqueio inclusive de bens que estão em nome de parentes e de objetos de valor, além dos imóveis e dos carros, a Polícia Federal fez ontem a Operação Perdeu, que consistiu no seqüestro de bens em 14 endereços dos fiscais no Rio e em Niterói. A decisão judicial, tomada pouco mais de um mês depois da prisão de 11 dos 13 fiscais, determinou o seqüestro dos bens de todos os acusados e de cinco cônjuges.

A Operação Perdeu foi feita por cerca de cem agentes da Delegacia de Repressão a Crimes Previdenciários da Polícia Federal no Rio (Deleprev-RJ). Eles cumpriram 14 mandados de seqüestro de bens. Todos os moradores dos imóveis, parentes dos acusados, optaram por assinar documentos como fiéis depositários dos objetos de valor encontrados nas residências.

Cofre lacrado e tela de plasma

O delegado Mauro Montenegro, titular da Deleprev, disse que os fiéis depositários não poderão vender ou se desfazer dos bens encontrados nas casas dos fraudadores:

¿ Se eles venderem ou emprestarem, serão presos imediatamente. A operação é uma maneira de assegurar ao Estado o ressarcimento futuro do prejuízo causado. Foi uma ação rápida. Investigamos, prendemos, e os bens já estão seqüestrados ¿ disse ele.

O seqüestro havia sido pedido pelos procuradores da República Fábio Aragão e Vinícius Panetto no dia 7 do mês passado. No dia 10 do mesmo mês, o juiz Flávio Roberto de Souza deferiu o pedido.

Dos 69 carros, a Operação Perdeu encontrou e já apreendeu 39. Também foram achados aparelhos de televisão de tela de plasma, um cofre, que foi lacrado, obras de arte e jóias. Os valores depositados nas contas bancárias bloqueadas ainda vão ser informados pelas instituições financeiras.

Remessa ilegal também investigada

Os bens e as contas estão nos nomes de Arnaldo Carvalho da Costa e sua mulher, Eliana Nogueira Mathias Costa; Antônio Vinícius Monteiro e sua mulher, Carmem Lucia Mathias Gonçalves; Paulinéa Pinto de Almeida; Francisco Cruz; Geanette Assumpção José; Arinda Rezende de Pinho Monteiro; Paulo José Gonçalves Mattoso; Rogério Gama Azevedo e sua mulher, Maria Juciara da Silva Azevedo; José Eduardo Gomes Iuorno; Joaquim Acosta Diniz e sua mulher, Roseli Bernardo da Silva Diniz; Luiz Ângelo Rocha; Jane Márcia da Costa Ramalho; e Francisco José dos Santos Alves e sua mulher, Euzie de Souza e Silva.

Moradores do edifício Heron Lakes, do luxuoso condomínio Barra Golden Green, na Barra da Tijuca, se assustaram com a presença de três agentes da PF ¿ um deles armado de fuzil ¿ e um delegado no prédio. Eles foram ao apartamento 803 na Rua Peregrino Júnior 355 para seqüestrar os bens do fiscal Francisco José dos Santos Alves, o único da quadrilha que continua foragido.

A mulher do fiscal, Maria Tereza, acompanhou os policiais na busca no apartamento. Além de dois carros guardados na garagem, um Honda Civic e um Xantia, da Citroën, a PF seqüestrou uma caixa de jóias. Ela foi fotografada, as jóias relacionadas e a mulher ficou como fiel depositária, proibida de vender qualquer peça sob pena de prisão. Maria Tereza também é fiscal do INSS.

O valor do apartamento declarado por Francisco é de R$750.960. No mercado, porém, é avaliado em cerca de R$1,7 milhão, segundo corretor de uma tradicional imobiliária da região. O Barra Golden Green tem heliporto, campo de golpe, jardim projetado pelo paisagista Burle Marx e lago com cisnes.

No condomínio Barra Summer Dream (Avenida Sernambetiba 3.604), outra equipe de quatro agentes da PF teve dificuldade para cumprir o mandado no apartamento 301 do bloco C, endereço do fiscal Joaquim Acosta Diniz. Embora o porteiro tenha informado que a mulher, Rosely, e os filhos estavam em casa, ninguém abriu a porta. Os agentes chegaram a chamar um chaveiro, depois de insistirem na campainha e darem batidas fortes na porta da frente. Uma hora mais tarde, um dos filhos do casal abriu a porta da cozinha, após ligar para a portaria e informar que não estava conseguindo acordar a mãe porque ela havia tomado tranqüilizantes. Pouco depois, Rosely apareceu na cozinha.

Se condenados, os fiscais podem ter penas de até 30 anos de prisão. Os bens bloqueados serão entregues ao INSS. Os fiscais respondem a processo pelos crimes de formação de quadrilha, contra a ordem tributária, excesso de exação (cobrança de tributo indevido com má-fé) e advocacia administrativa.

Os fiscais presos entraram com pedido de revogação de prisão preventiva na 3ª Vara Federal Criminal. Todos os pedidos, porém, foram negados.

¿ O Ministério Público acredita na Justiça e acha que será muito difícil que os fiscais respondam ao processo em liberdade ¿ disse o procurador Fábio Aragão.

Os fiscais também são investigados por lavagem de dinheiro e remessa ilegal para o exterior. O fiscal Antônio Vinícius Monteiro é sócio de uma empresa na Flórida e de um imóvel construído pela empresa na cidade de Orlando, no valor de US$110 mil, como mostrou reportagem do GLOBO.