Título: SEVERINO MANOBRA PARA PÔR DEPUTADAS CONTRA ABORTO EM COMISSÃO DO GOVERNO
Autor: Evandro Éboli
Fonte: O Globo, 07/04/2005, O País, p. 4

Presidente da Câmara trocou dois dos três nomes indicados pela bancada feminina

BRASÍLIA. Numa manobra para favorecer os argumentos contrários ao aborto, o presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti (PP-PE), ignorou duas das três indicações de parlamentares feitas pela bancada feminina da Casa para integrar a comissão do governo que vai discutir a regulamentação do aborto. Severino excluiu da lista as deputadas pró-aborto Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Doutora Clair (PT-PR) e as trocou por Angela Guadagnin (PT-SP) e Elaine Costa (PTB-RJ), contrárias a essa prática.

Jandira: ¿Houve a quebra de um acordo¿

O presidente da Câmara é contrário ao aborto mesmo nos casos considerados legais, como a gravidez em caso de estupro e quando há risco para a gestante e o feto. A coordenação da comissão é da Secretaria Especial das Políticas Para Mulheres. A bancada feminina reuniu-se semana passada e escolheu, além de Jandira e Clair, a deputada Sueli Campos (PP-RR).

A ministra da Secretaria Especial das Mulheres, Nilcéa Freire, teria pedido a Severino que indicasse oficialmente para a comissão as três escolhidas pelo grupo.

Mas, na última hora, Severino trocou os nomes. A posse dos integrantes da comissão ¿ formada também por representantes da sociedade civil e do governo federal ¿ aconteceu ontem. Jandira disse que estivera com Severino semana passada e que ele teria confirmado a indicação dos nomes escolhidos pela bancada. O presidente teria chamado uma assessora e pedido que formalizasse ofício a Nilcéa com os nomes.

¿ Mas, para surpresa nossa, a lista enviada foi outra. Houve a quebra de um acordo. E não fomos informadas de nada. Aconteceu uma corrida individual por essas vagas ¿ disse Jandira, autora de projeto que regulamenta o aborto no país.

Angela: ¿Mesmo estuprada, a mulher deve ter o filho¿

Elaine Costa confirmou que pediu a Severino para ser indicada para uma das vagas independentemente da lista da bancada feminina. A deputada disse que luta pela questão feminina mas nunca teve vez na gestão de João Paulo Cunha (PT-SP) na presidência da Câmara.

¿ Por que somente as mulheres do PT e do PCdoB podem participar e as outras não? ¿ disse a deputada.

Elaine afirmou ser contra o aborto, mas disse que está aberta a discussões na comissão. A deputada apresentou-se como uma ¿católica praticante¿ e afirmou que pretende conversar com setores da Igreja no Rio para se orientar na comissão.

Ângela Guadagnin (PT-SP) disse que não fez campanha para integrar a comissão, mas afirmou ter certeza de que Severino a escolheu por causa de suas posições radicais contra qualquer tipo de aborto.

¿ Respeito as indicações da bancada feminina, da qual faço parte, mas a prerrogativa de escolher é do presidente da Câmara. Não fui atrás dessa vaga.

Angela disse que pretende representar na comissão do governo as correntes contrárias ao aborto. Ela é contra até mesmo no caso de estupro.

¿ Mesmo estuprada, a mulher deve ter o filho. Se ela abortar, cometerá um crime maior que o cometido pelo estuprador. Se ela não quiser o filho depois, pode encaminhá-lo para adoção ¿ disse a petista.

Jandira disse que os critérios usados pela bancada não foram partidários, mas de experiência em relação ao assunto. Os três nomes, segundo ela, foram escolhidos por consenso.