Título: 2006 NA RUA
Autor: Helena Chagas
Fonte: O Globo, 11/04/2005, O País, p. 4

Não há nenhuma novidade na defesa da reeleição do presidente Lula que o ministro José Dirceu fez na reunião do Campo Majoritário deste fim de semana. Já a afirmação de que o presidente não vai entrar no processo eleitoral antes da hora cheira a uma certa conversa para boi dormir. Na verdade, Lula não tem feito outra coisa. 2006 está na rua e agora não tem mais volta.

As coisas estão mais avançadas do que se imagina, graças sobretudo ao empenho pessoal do presidente nas articulações. Só nas últimas semanas, Lula acenou concretamente aos caciques do PMDB com a vaga de vice em sua chapa, promoveu uma aproximação com a ala oposicionista do partido e começou a montar, prego por prego, os palanques estaduais. Nas viagens pelo Brasil, trata pessoalmente de cada detalhe de cada aliança.

E começam a ficar nítidos os primeiros traços do desenho de 2006:

1. O anti-Lula ainda não apareceu - É o que indicam as pesquisas e o que dá alento aos governistas. A popularidade presidencial sofre pequenas quedas e a oposição está tirando partido da desarticulação política e da irritação de setores da sociedade com o excesso de gastos e a carga tributária. Até agora, porém, ninguém consegue responder a uma perguntinha básica: Lula pode perder a eleição para quem? Esse sujeito ainda não deu as caras.

2. Nas mãos do PMDB: com Garotinho, tem segundo turno - Não é pelos belos olhos de seus dirigentes, e nem pela capilaridade da maior máquina partidária, que o Planalto quer o PMDB como aliado preferencial, a quem ofereceu até a vice. É, sobretudo, pelo potencial de estrago que uma candidatura Garotinho por um partido grande, com palanques fortes e tempo na TV, pode provocar. Não que tenha grande chance. Mas pode muito bem arrastar a eleição para um perigoso segundo turno ¿ tudo o que Lula e o PT não querem. Por isso, a ordem é conquistar o PMDB e fulminar a candidatura Garotinho pelo partido (se ele sair por uma legenda pequena, não atrapalha tanto).

3. No toma-lá-dá-cá dos palanques, Lula tem que enquadrar o PT - É a articulação que mais vem ocupando o presidente, e deixando os petistas de cabelo em pé. Lula tem deixado claro nas conversas com aliados que o PT deve desistir de disputar os governos em diversos estados para ceder a cabeça de chapa ao PMDB. Por exemplo: Goiás, Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul. Em outros, como Rio, Rio Grande do Sul e Distrito Federal, pode até ter candidatos pouco competitivos no primeiro turno e, no segundo, fechar com o PMDB. Num terceiro grupo estão os estados onde o PT, mesmo como cabeça de chapa, deve esquecer antigas desavenças e compor com ex-adversários. Como o governador Jarbas Vasconcelos, em Pernambuco ¿ com quem Lula já conversou pessoalmente.

4. Tudo começa por São Paulo - É o centro das preocupações do presidente, que sabe que se não fizer uma boa aliança ali terá suas chances de reeleição reduzidas. Além de cuidar para que a disputa Aloizio Mercadante-João Paulo-Marta Suplicy não imploda de vez o PT e seu governo, Lula trabalha para fechar uma aliança paulista com o PMDB. Não por acaso recebeu Michel Temer e Orestes Quércia nos últimos dias. E já tem o desenho na cabeça: Mercadante para governador, tendo um peemedebista ¿ que pode ser Temer ou qualquer nome ligado a Quércia ¿ como vice. Nesse arranjo, o ex-governador desistiria de sua candidatura ao governo do estado e sairia para deputado. Eduardo Suplicy para o Senado.

5. Vice não fica a pé - Nos planos de Lula, José Alencar sairia candidato ao governo de Minas numa chapa PL-PT que teria o ex-presidente Itamar Franco como candidato a senador.

6. PSDB e PFL encontraram um discurso - Já a oposição, que há meses vivia a crônica da derrota anunciada em 2006, animou-se com as recentes agruras políticas do Planalto. Não será fácil, mas acham que a fatura da reeleição também não está liqüidada a favor de Lula. Estão levando o assunto a sério e já escolheram o mote, que começa a sensibilizar a classe média: carga tributária elevada, excesso de gastos públicos.

7. Quem ficar no caminho leva chumbo - Cesar Maia que o diga. Nocauteada com a intervenção na saúde do Rio, a candidatura precoce do prefeito serviu de alerta. O PSDB recolheu os flaps e desistiu de lançar candidato agora: o tucano que entrar no alvo desde já pode chegar depenado a 2006. Uma coisa é certa: o jogo vai ser pesado.