Título: Da pirataria ao pólo exportador
Autor: Valderez Caetano
Fonte: O Globo, 10/04/2005, Economia, p. 27

Sebrae: Arranjo Produtivo Local pode trazer ao mercado formal 5 milhões de trabalhadores

Conhecida no passado como ¿Paraguai brasileiro¿ pela dedicação de suas empresas à fabricação de jeans pirata ¿ das marcas Zoomp, Forum, Levi¿s e outras ¿ a cidade goiana de Jaraguá, a 200 quilômetros do Distrito Federal, agora tem até grife própria: a Pequi Brasil. Jaraguá foi eleita pelo governo federal e pelo Sebrae como modelo de Arranjo Produtivo Local (APL) ¿ conglomerados de empresas da mesma cadeia produtiva instaladas na mesma cidade ou estado. Hoje, o município é candidato a se tornar pólo exportador de confecções com marcas próprias. Deixou para trás os anos à margem da lei e formalizou praticamente metade das mil empresas. O desemprego das pessoas entre 16 e 40 anos é baixo ¿ cerca de 5% ¿ e o salário-mínimo nas empresas de confecção varia de R$350 a R$400.

Mudanças significativas, principalmente de mentalidade empresarial, em APLs como Jaraguá tiveram início em 2002, quando o Sebrae abraçou esses núcleos de produção como prioridade. Mas o fortalecimento de políticas institucionais para o setor veio em 2004: o governo federal unificou todas as ações de APLs no Ministério do Desenvolvimento e os incluiu nas ações da política industrial, com o lançamento do Programa Nacional de APLs.

¿ Jaraguá tinha o estigma da ilegalidade e pirataria, e ninguém trabalhando para melhorar. Fiquei espantado. Hoje são 418 empresas formais. É claro que não fizemos tudo. A sociedade pactuou um plano de ação: o Sebrae é o catalisador, mas quem planejou foram as confecções ¿ diz o gerente de Inovação e Acesso Tecnológico do Sebrae, Miguel Ivan Lacerda.

¿ O que ajudou foi o governo definir prioridades, setores sobre os quais vai atuar ¿ afirma o secretário de Desenvolvimento da Produção do Ministério do Desenvolvimento, Antônio Sérgio Mello.

Ipea: sucesso depende de empregos de qualidade

A exemplo de Jaraguá ¿ onde o núcleo emprega dez mil pessoas ¿ o governo elegeu outros dez APLs como projetos-piloto entre os 440 pólos de produção identificados no Brasil. Estes incluem desde regiões de baixíssima produtividade até áreas competitivas, como o pólo calçadista de Franca (SP). Os resultados parciais do programa fizeram o Sebrae estimar que, a curto prazo, cinco milhões de trabalhadores passarão a ter carteira assinada. Se a estimativa se concretizar, será o equivalente a trazer para o mercado formal 50% dos trabalhadores hoje informais nas APLs.

Segundo Miguel Lacerda, uma das principais metas do Programa Nacional de APLs é acabar com a grande informalidade que marca esses pólos de produção, treinar pessoal na área de gerenciamento e vendas e conceder crédito.

Nessas unidades é comum a atividade ser tocada por famílias e amigos, num regime pouco profissional, portanto de baixa produtividade e pouco capacidade de inovação. Isso, diz Lacerda, inviabiliza saltos maiores como a conquista de novos mercados dentro e fora do país.

¿ O sucesso de uma política industrial inclui a criação de empregos de qualidade. Política industrial e política de emprego são indissociáveis ¿ diz Lenita Turchi, economista do Ipea, que integra o Programa Nacional de APLs e é responsável pela pesquisa que mapeou o pólo de Jaraguá.

O programa do governo tem só R$16,7 milhões até 2007. Porém, a principal ferramenta de intervenção é criar um plano-diretor ¿ em geral feito pelo município sob a supervisão do Sebrae, com metas de formalização, modernização, formação de pessoal e conquista de mercado ¿ e conceder crédito mais barato, intermediando o acesso a microcrédito do BNDES, fundos constitucionais de desenvolvimento regional, entre outros.

Em troca, o governo pede a formalização da empresa e o fim do trabalho infantil, normal nos APLs de baixa produtividade. Algumas famílias não consideram que uma criança trabalha ao pregar botões ou dobrar malhas de confecção.

Qualquer empresa num pólo produtivo pode pedir tratamento de APL. Apesar de er eleito só 11 como piloto, até o fim do ano outros cem arranjos ficarão sob o guarda-chuva governamental, diz a coordenadora do programa no Ministério do Desenvolvimento, Ena Colnago. Entre os 11 APLs escolhidos há oito núcleos de confecção de roupa íntima em cidades perto do Distrito Federal, outros 12 em Apucarana (PA) e o complexo de produção de fruticultura em Petrolina/Juazeiro (PE), entre outros.

CRESCIMENTO NÃO GARANTE DESENVOLVIMENTO SOCIAL, na página 28