Título: CASO KROLL: PF INDICIA A PRESIDENTE DA BRT
Autor: Geralda Doca, Mônica Tavares e Ramona Ordoñez
Fonte: O Globo, 12/04/2005, Economia, p. 21

Carla Cico pode ser acusada na Justiça por formação de quadrilha, corrupção ativa e espionagem inclusive do governo

BRASÍLIA e RIO. A presidente da Brasil Telecom, Carla Cico, foi indiciada ontem pela Polícia Federal (PF) por formação de quadrilha, divulgação de segredo (espionagem ilegal) e corrupção ativa. A pena prevista para o primeiro tipo de crime, por exemplo, é de um a três anos, e para o segundo, de um a quatro anos. No caso de corrupção ativa, a reclusão pode chegar a 12 anos. A partir de agora, a PF, que antes suspeitava do envolvimento de Carla com os crimes, já tem uma denúncia formal contra a executiva. O inquérito deverá ser concluído até o fim deste mês e enviado à Justiça, que decidirá se aceita ou não a denúncia.

Segundo a PF, o banqueiro Daniel Dantas, dono do Opportunity, empresa que controla a Brasil Telecom, será intimado hoje e deverá depor amanhã na sede da PF no Rio. Os dois são acusados de montar um esquema de espionagem ilegal no Brasil, ao contratar a empresa de auditoria americana Kroll para investigar integrantes do governo e a Telecom Italia ¿ sócia do Opportunity na BrT e inimiga do grupo de Dantas.

Advogado diz que inquérito é tendencioso

Durante o depoimento de três horas à diretoria de Inteligência da PF, a executiva ¿ que estava acompanhada por sete pessoas, entre assessores e advogados ¿ respondeu a todas as perguntas. Mas ela aparentava nervosismo, afirmaram fontes da PF. As declarações de Carla, no entanto, não teriam acrescentado fatos novos às investigações, nem ajudaram a derrubar provas sobre o envolvimento da presidente da Brasil Telecom e de Dantas na rede de espionagem.

Carla deixou o prédio visivelmente abalada e não quis dar entrevista. O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, que fazia parte do grupo que a acompanhava, disse apenas que ¿o depoimento foi tranqüilo¿. Também estavam presentes o advogado Nelio Machado e o presidente do Conselho de Administração da Brasil Telecom Participações, Luiz Octávio da Motta Veiga.

Já no Rio, em uma entrevista coletiva, Nelio Machado chamou de ¿tendencioso e ilegal¿ o inquérito da PF sobre a contratação da Kroll.

¿ Foi um ato arbitrário, inconsistente, abusivo e ilegal (o indiciamento de Carla). Não está fundamentado e tudo nasce de uma presunção. Em outubro do ano passado já se anunciava que essas pessoas seriam indiciadas ¿ disse o advogado, referindo-se também a Dantas.

Machado acredita que o dono do Opportunity também será indiciado após seu depoimento à PF. O advogado disse estranhar o fato de que os dois executivos somente foram chamados a depor agora, no inquérito policial. Para Machado, deve ser investigado um executivo da Telecom Italia, Angelo Janone, que, segundo o advogado, teria afirmado em depoimento ter grande influência junto à PF. O executivo não foi localizado ontem pelo GLOBO.

O advogado já tinha dado entrado na semana passada com um pedido de liminar tentando evitar o indiciamento de Carla Cico. Machado ainda vai decidir se utiliza o mesmo pedido para solicitar a suspensão do indiciamento da executiva ou se dará entrada em um novo pedido.

¿ Foi feito um verdadeiro linchamento moral da executiva que é prestigiada no mundo todo, uma das maiores autoridades em telefonia, que trabalhou na China, na Índia. Ela não pode ser tratada como quadrilheira e como bandida, e o que aconteceu hoje (ontem) foi isso. Daí nosso cabal protesto ¿ afirmou Machado.

Caso é isolado, segundo ministro das Comunicações

Ao longo de 2003 e até meados de 2004, a Kroll rastreou os contatos da Telecom Italia e captou e-mails trocados entre o ministro Luiz Gushiken, titular da Secretaria de Comunicação de Governo, e o empresário Luiz Roberto Demarco, ex-sócio de Dantas ¿ e com quem o banqueiro briga na Justiça. A empresa também monitorou o encontro de executivos da Telecom Italia com o ex-presidente do BB Cassio Casseb, ex-conselheiro da empresa italiana no Brasil.

O Opportunity e a Telecom Italia brigaram por causa do preço pago na compra da operadora Companhia Riograndense de Telecomunicações (CRT), que pertencia à Telefônica. Afastada da Brasil Telecom por questões regulatórias, a italiana já foi autorizada pelo governo a voltar, mas o Opportunity a impede na Justiça.

O ministro das Comunicações, Eunício Oliveira, não quis comentar o indiciamento de Carla Cico. Ele disse apenas que o ministério não interfere nessa questão.

¿ É um caso específico, isolado. Não tem a ver com o setor. Estou até surpreso. Isso é questão da Polícia Federal. O ministério não se mete nisto ¿ disse Eunício Oliveira.