Título: SENADO VETA CHEFE DA ANP
Autor: Gerson Camarotti e Ramona Ordoñez
Fonte: O Globo, 13/04/2005, Economia, p. 23

PMDB derrota governo e comissão recusa José Fantine para dirigir agência

Numa demonstração explícita de insatisfação com a ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, e o Palácio do Planalto, o PMDB impôs ontem uma pesada derrota ao governo, ao articular o veto da Comissão de Infra-Estrutura do Senado ao nome de José Fantine para o cargo de diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Ele foi rejeitado por um placar apertado ¿ 12 votos contrários e 11 a favor ¿ num veto inédito da comissão a uma indicação do Executivo para o comando geral de uma agência reguladora.

Surpreendido pela derrota, o governo ainda vai tentar aprovar o nome de Fantine no plenário do Senado. Fantine era uma indicação de Dilma para substituir o embaixador Sebastião do Rêgo Barros, indicado ainda por Fernando Henrique Cardoso. A comissão do Senado aprovou apenas o nome de Victor de Souza Martins ¿ afilhado político do governador do Espírito Santo, Paulo Hartung ¿ para diretor da ANP.

¿ Houve quebra de confiança e traição. Pelos integrantes da comissão, a base governista tinha 13 votos. Como oposicionistas votaram com a gente, a traição foi grande. Vamos tentar aprovar o nome de Fantine no plenário, mas só quando todos os problemas forem resolvidos ¿ lamentou o líder do PT no Senado, Delcídio Amaral (MS).

Desde a semana passada, integrantes do PMDB mandaram recados de que o governo poderia ser surpreendido. Oficialmente, o líder do partido, senador Ney Suassuna (PB), culpou Dilma pela derrota. Alegou que ela tinha problemas com a bancada, inclusive negando indicações de senadores para estatais.

Mas no Planalto a avaliação é de que a insatisfação com Dilma, apesar de concreta, oculta uma queda-de-braço entre o PMDB governista e o núcleo do governo. Para um ministro, os peemedebistas quiseram dar uma demonstração de força para reivindicação de cargos, liberação de emendas e até a manutenção do ministro da Previdência, Romero Jucá, alvo de denúncias.

Ontem, o presidente Lula, que está em viagem à África, foi informado da derrota. Para mais de um interlocutor, o chefe da Casa Civil, José Dirceu, atribuiu o veto a uma articulação do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

Governo pode mexer na Eletronuclear

Antes mesmo da votação, Suassuna dizia que Fantine tinha muita chance de ser derrotado. Entre as razões alegadas estava o veto ao nome do afilhado político do senador Waldir Raupp (PMDB-RO), Winter Coelho, para uma diretoria da Eletronorte. O PT conseguiu nomear Edmar Palocci, irmão do ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Suassuna também lembrou que Dilma esvaziou o poder da Cepisa, a companhia energética do Piauí, em que está um afilhado senador Alberto Silva (PMDB-PI):

¿ Essa ministra vem criando muitas inimizades com os senadores. Não atende ninguém e veta nossos nomes. Essa foi uma resposta do Senado.

Além disso, o PMDB governista ainda não conseguiu indicar diretorias no Banco do Nordeste (BNB), nos Correios e na Infraero.

¿ Para mim, esses vetos aos nomes indicados pelo PMDB são decididos pela coordenação política do Planalto ¿ disse Raupp.

O governo ficou assustado com a mobilização do PMDB. Até porque não esperava um veto a Fantine, de perfil técnico. Antes de indicá-lo, Dilma rejeitara vários nomes políticos, inclusive do atual presidente em exercício da ANP, o ex-deputado Haroldo Lima (PC do B-BA).

¿ O José Fantine, que é um técnico competente, pagou por um problema político ¿ lamentou o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP).

O presidente da Comissão de Infra-estrutura, Heráclito Fortes (PFL-PI), não escondeu a surpresa:

¿ O plenário é soberano, mas não há precedente disso na Casa.

O presidente em exercício da ANP, Haroldo Lima, também disse que o gesto foi político. Para o especialista Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE), Fantine pode ter sido rejeitado também por questões técnicas. Defensor de posições polêmicas, como a não-abertura do mercado, pode ter sido ser usado contra Fantine o argumento de que ele ameaçaria a autonomia da ANP.

Preocupado com a pressão política nas estatais, o governo pode anunciar amanhã, durante reunião de conselho de administração, a mudança de comando da Eletronuclear, com a demissão do presidente Zieli Dutra Thomé Filho. Indicado pelo ex-presidente da Eletrobrás José Pinguelli Rosa, Zieli perdeu força com a queda do padrinho.

O engenheiro Paulo Figueiredo, presidente do Nucleos (fundo de pensão dos funcionários da Eletronuclear) deve ser indicado para a presidência da estatal. Especula-se que o PT ficaria com a presidência da Eletronuclear. Mas o PMDB estaria de olho em um dos quatro cargos de diretores da empresa, e o partido, que já indicou o presidente da Eletrobrás, Silas Rondeau, também pediria cargos na controladora da Eletronuclear.

COLABORARAM Mirelle de França e Adriana Vasconcelos