Título: TECNOLOGIAS AMEAÇAM 1ª ELEIÇÃO DA ERA DIGITAL
Autor:
Fonte: O Globo, 14/04/2005, O Mundo, p. 29
Vaticano intensifica cuidados para que telefones celulares, internet e fax não violem o isolamento dos cardeais
CIDADE DO VATICANO. Antigamente, diziam que as paredes tinham ouvidos. Mas atualmente pode-se dizer que elas fotografam, transmitem texto e imagens. Os cardeais que escolherão o sucessor de João Paulo II terão que se preocupar com muito mais do que ouvidos indiscretos atrás da porta. Um dos desafios do primeiro conclave da era digital é justamente manter seu caráter secreto e medieval diante de telefones celulares que fotografam e gravam conversas, internet e aparelhos de fax que podem furar os grossos muros do Vaticano.
As invenções que se popularizaram desde a escolha de Karol Wojtyla, em 1978, contrastam com o juramento que fazem os cardeais de se isolarem completamente do restante do mundo durante as votações.
Muro eletromagnético contra celular
A Constituição Apostólica proíbe os cardeais-eleitores de lerem jornais, escutarem rádio, assistirem à TV e se comunicarem com o exterior para ¿se protegerem da indiscrição alheia e de eventuais ameaças que possam afetar a independência de julgamento e liberdade de decisão¿. As regras se aplicam tanto à Capela Sistina, local das votações, como à Residência Santa Marta, o hotel na área do Vaticano onde ficam hospedados.
As normas contrastam com os costumes de João Paulo II, que utilizou como ninguém os meios de comunicação e que especificou algumas dessas regras. O Papa várias vezes estimulou a Igreja Católica a utilizar as possibilidades que as novas tecnologias ofereciam em sua missão de evangelizar.
A maioria dos 115 cardeais que participam do conclave, a partir do dia 18, atendeu ao chamado e utiliza também essas novas ferramentas. Alguns possuem websites. Um deles, o cardeal alemão Joseph Ratzinger, tem até um fã-clube on line, que vende bonés e camisetas do ex-prefeito da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé.
Desde a morte do Papa, a internet tem sido um dos meios usados por vaticanistas para expor teorias sobre os candidatos. A rede se tornou ainda palco de apostas, sobre quem será o sucessor de João Paulo II e quantos dias durará o conclave.
Muitos especialistas se perguntam se os muros da Santa Sé serão suficientes para proteger o segredo do conclave. Na dúvida, um ¿muro eletromagnético¿ será ativado para que os cardeais não possam usar celulares dentro do Vaticano.
Além dos cardeais, que há dias fizeram voto de silêncio em relação à imprensa, negando-se a dar entrevistas até o fim do conclave, todos que tenham contato com eles também se comprometem a guardar segredo sobre informações a que possam ter acesso.
Motoristas, ascensoristas, encarregados da limpeza, médicos e outras dezenas de profissionais, laicos ou religiosos, vão prestar ¿um juramento de palavra e por escrito¿ amanhã à tarde, diante do camerlengo, a autoridade máxima do Vaticano durante o período de transição.
Sistema antiespionagem na Santa Sé
Outra preocupação do Vaticano é em relação à espionagem. Segundo o vaticanista Marco Tossatti, do jornal ¿La Stampa¿, o assunto desperta ¿um grande interesse nos serviços de inteligência de todo o mundo¿, que poderiam tentar descobrir os favoritos e influenciar o processo eleitoral. O Vaticano, que já utilizava sistemas para se precaver contra espionagem, intensificou-os para o conclave.
¿Um sistema americano defenderá o segredo da votação. Todas as zonas afetadas pelo conclave estarão protegidas¿, afirmou Tossatti. Tecnologias modernas para manter uma tradição de mais de 700 anos.