Título: VÍRUS LETAL É ENVIADO POR ENGANO A 18 PAÍSES
Autor: Demétrio Weber e Flávio Freire
Fonte: O Globo, 14/04/2005, Ciência e Vida, p. 30

Brasil recebeu amostras do H2N2, que causou a pandemia de gripe de 1958 e matou até 4 milhões de pessoas

GENEBRA, BRASÍLIA e SÃO PAULO. Numa decisão equivocada e ainda não totalmente esclarecida, uma instituição de pesquisa americana enviou a quase 4 mil laboratórios em 18 países, entre eles o Brasil, amostras de um vírus da gripe especialmente letal. Trata-se do H2N2, causador da pandemia de 1957/58, a chamada gripe asiática, que matou de um a quatro milhões de pessoas em todo o mundo.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) pediu na tarde de terça-feira a destruição de todas as amostras, temendo o risco de uma pandemia ¿ que é considerado pequeno, mas não desprezível.

¿ O vírus poderia causar uma epidemia global de gripe. Foi uma decisão pouco acertada enviá-lo ¿ disse o coordenador do programa de gripe da OMS, Klaus Stohr, lembrando que o vírus é facilmente transmissível entre seres humanos e poucas pessoas têm imunidade contra ele.

A empresa Meridian Bioscience Inc. enviou amostras de diversos vírus a laboratórios como parte de uma rotina de testes a serem feitos para a obtenção de um certificado de qualidade do Colégio Americano de Patologistas. Para obter o certificado, os laboratórios devem ser capazes de identificar os vírus enviados.

Não se sabe exatamente por que um vírus tão letal teria sido incluído nas amostras, mas o caso levantou questões sobre a segurança dos laboratórios americanos. As amostras foram enviadas no fim de 2004, mas somente em 26 de março um laboratório canadense percebeu o problema.

O Ministério da Saúde anunciou ontem que já foram localizadas e destruídas no Brasil as amostras do vírus mortal H2N2. Apenas dois laboratórios ¿ o do Hospital Albert Einstein e o Fleury, ambos em São Paulo ¿ receberam amostras. Após alerta da OMS, as amostras foram destruídas anteontem à noite.

Ministério descarta risco de contágio no país

O secretário nacional de Vigilância em Saúde, Jarbas Barbosa, descartou qualquer risco de contágio no país. Segundo ele, apenas três funcionários do Albert Einstein e do Fleury manipularam o vírus. A direção dos dois laboratórios paulistas também descartaram risco de contaminação.

¿Transcorridas três semanas da manipulação, realizada segundo os padrões de biossegurança da OMS, nenhum dos dois profissionais do laboratório que manipularam a amostra apresenta quaisquer sintomas de infecção. Vale ressaltar que esse período é muito superior ao de incubação desse tipo de vírus, que é de sete dias¿, diz nota oficial do Albert Einstein. A direção do Laboratório Fleury esclareceu ainda que o material ficou armazenado num freezer com temperatura de 80 graus Celsius negativos.

Jarbas Barbosa defendeu mais rigor na fiscalização de entidades como o Colégio Americano de Patologistas. Ele ressalvou que isso deve ser feito pelas autoridades de cada país, mas acredita que o episódio mostra que a OMS deve cobrar mais atenção dos governos:

¿ É um erro grave. Os laboratórios que produzem e distribuem kits precisam receber uma fiscalização mais rigorosa.