Título: LDO e sucessão
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 16/04/2005, O Globo, p. 2

A Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2006 encaminhada ontem ao Congresso tem indisfarçáveis preocupações com a sucessão presidencial. Tem o que os petistas chamam de dois ¿cala-tucanos¿: a fixação de limites para a carga tributária e para os gastos com custeio. Mas não resolve o que será um dos pontos críticos do discurso eleitoral de Lula: o valor real do salário-mínimo.

As duas primeiras medidas serão usadas para rebater a crítica mais contundente de pefelistas e tucanos, a de que o governo cobra muito imposto e gasta demais, sobretudo quando limita a carga tributária ao patamar herdado do governo que a elevou em dez pontos percentuais do PIB. Mas a questão do salário-mínimo não tem nem terá solução. Na campanha, terá de ser enfrentada com o argumento que todos os antecessores de Lula usaram, o de que aumentos mais significativos comprometeriam fatalmente as contas da Previdência. Talvez seja esta a questão que mais tenha tocado Lula quanto à diferença entre governar e fazer oposição.

Na campanha de 2002 ele prometeu dobrar o valor do salário-mínimo em seus quatro anos de mandato. Já no primeiro ano, deparou-se com a barreira de sempre, o impacto sobre uma Previdência deficitária que paga mais de 18 milhões de benefícios de salário-mínimo, entre aposentadorias, Funrural e bolsas da Loas. Recebeu o mínimo com o valor de R$200. Em maio de 2003, no auge das dores do ajuste fiscal, foi corrigido para R$240. O desgaste foi grande mas havia a desculpa de que o Orçamento fora herdado. No ano passado, ao final de longas e sofridas reuniões, Lula acabou cedendo aos argumentos de Palocci e o salário-mínimo foi reajustado para R$260. Mas no final de 2004, quando se fechava o Orçamento, Lula teve uma conversa com Palocci mostrando-lhe que era preciso garantir um aumento melhor em 2005. PT, aliados e oposição, que também têm eleição à vista, estavam dispostos a bancar um aumento maior. Aprovaram uma fórmula que tende a virar regra: a correção do valor pela inflação mais a variação do PIB per capita. Isto elevaria o salário-mínimo de R$260 para R$281, mas o governo foi além, programando para a partir do mês que vem, o salário-mínimo de R$300, o melhor já dado por Lula. Mas ainda assim, muito aquém do esperado para o terceiro ano de mandato, segundo a promessa feita. Na LDO apresentada ontem para 2006, o governo dispõe-se a manter a fórmula do Congresso. A economia crescerá este ano mas é certo que não tanto quanto no ano passado. E com isso, nem mesmo a duplicação nominal dos R$200 de 2002 será possível.

Nesta questão não haverá como calar os adversários. E ela toca diretamente o eleitorado de Lula, que em 2006 deve minguar na classe média e expandir-se entre os mais pobres.