Título: INFLUÊNCIA ULTRACONSERVADORA
Autor: Priscila Guilayn
Fonte: O Globo, 16/04/2005, O Mundo, p. 30

Com forte presença na cúpula da Igreja, Opus Dei exerce poder na escolha do Papa

Opadre José María Escrivá de Balaguer tinha 26 anos em 1928, quando fundou em Madri uma residência de estudantes. Com uma dúzia de discípulos, deu início a sua Obra de Deus ¿ em latim, Opus Dei. Quando morreu, em 1975, eram 60 mil seguidores. Hoje, já são mais de 84 mil. A influência desta organização ultraconservadora sobre a escolha do novo Papa é inquestionável, e são considerados seus simpatizantes vários dos cardeais apontados como possíveis sucessores de João Paulo II.

Reconhecida pelo Concílio Vaticano II e pelo Código de Direito Canônico, a organização tem como objetivo ¿contribuir com a missão evangelizadora da Igreja¿. Sua relação com Karol Wojtyla teve início na década de 60, mas se consolidou entre os anos 80 e 90 ¿com a irresistível ascensão da Opus Dei à cúpula do Vaticano¿, segundo o teólogo Juan José Tamayo-Acosta. João Paulo II beatificou Balaguer em 1992 e o canonizou em 2002.

¿ A Opus é e opera como uma Igreja dentro da Igreja ¿ afirma Tamayo-Acosta, catedrático da Universidade Carlos III que há dois anos teve um tese sobre Jesus Cristo censurada pelo Vaticano.

Para o teólogo, a nomeação do médico espanhol Joaquín Navarro-Valls, membro da Opus Dei, como diretor de Comunicação da Santa Sé significou ¿um salto qualitativo no protagonismo da Opus dentro do Vaticano¿.

¿ A Opus, um dos grupos mais poderosos dentro da cúpula do Vaticano, está exercendo sua influência, sem dúvida alguma, para que o sucessor de João Paulo II siga sua ideologia. Dificilmente o próximo Papa não estará inclinado para o Opus ¿ diz ele.

Organização nega interferência

Em Madri, o escritório central do Opus Dei ¿ que reúne pelo menos 33 mil fiéis ¿ nega que a organização exerça tamanho poder na Cúria Romana, assinalando que dos 115 cardeais que votarão no conclave que terá início segunda-feira, apenas dois são seus membros: o peruano Juan Luis Cipriani e o espanhol Julián Herranz. Mas Tamayo-Acosta comenta:

¿ Não importa tanto a quantidade, e sim o peso da Opus Dei no conclave. Certamente nenhum desses dois cardeais será eleito, mas ambos exercerão influência para que seja escolhido um pontífice que siga sua linha ideológica e seu modelo de Igreja.

Embora não sejam membros da Opus Dei, vários influentes cardeais eleitores são considerados simpatizantes da organização, entre eles o italiano Angelo Sodano, secretário de Estado até a morte do Papa; o camerlengo, Eduardo Martínez Somalo; o patriarca de Veneza, Angelo Scola; e o colombiano Darío Castrillón. A lista inclui ainda pelo menos três considerados papáveis: o alemão Joseph Ratzinger, decano dos cardeais; o arcebispo de Milão, Dionigi Tettamanzi, e o arcebispo de Bombaim (Índia), Iván Dias.

Para Enrique Miret Magdalena, presidente da progressista Associação de Teólogos João XXIII, a presença da Opus no Vaticano não deverá sofrer alterações significativas, independentemente de quem seja eleito Papa.

¿ Acredito que se for um papa inclinado à Opus nada mudará. Se não for, pode ser que tenha mais dificuldades, mas a presença da Opus se manterá igualmente ¿ afirma o teólogo.

Já o jesuíta José Ignacio González Faus diz que o verdadeiro poder está nas mãos da Cúria:

¿ Como bons católicos, o previsível é que os membros da Cúria obedeçam ao novo Papa, seja ele ligado ou não à Opus. No entanto, os papas que em geral não compartilhavam a linha ideológica da Cúria atravessaram dificuldades. Na minha opinião, a Cúria tem mais poder que os pontífices.

A Opus Dei se manifesta com aparente imparcialidade. Em nota, seu líder, Javier Echeverría, disse não fazer distinção entre os candidatos.