Título: UNIVERSIDADE CONTRARIA LEI AO TERCEIRIZAR CURSOS
Autor: Demétrio Weber
Fonte: O Globo, 17/04/2005, O País, p. 15

Gerida por fundação sem fins lucrativos, a Unipac, do deputado Bonifácio de Andrada, contratou empresa privada

BRASÍLIA. A Universidade Presidente Antônio Carlos (Unipac), que tem como reitor licenciado o deputado federal Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), é uma das instituições particulares de ensino superior que mais cresceram no país nos últimos anos. Sua expansão, no entanto, está envolvida numa polêmica: a Unipac terceirizou a oferta de ensino superior, o que é proibido pela legislação.

Com 27 mil alunos em cerca de 150 municípios de Minas Gerais e Tocantins, a universidade pertence à Fundação Presidente Antônio Carlos (Fupac), entidade sem fins lucrativos da qual o deputado é presidente licenciado. A Fupac contratou uma empresa privada, a Educare, que não é credenciada como instituição de ensino, para abrir cursos superiores. A Educare recebia dinheiro dos alunos e repassava parte da verba para a fundação.

Denúncia surgiu em ação de ex-sócia da Educare

O caso veio à tona a partir de ação ajuizada pela pedagoga Diva Batista de Moura e Silva na 8ªVara Cível de Juiz de Fora (MG). Diva cobra indenização por ter sido afastada da empresa Educare Ltda., que ela acusou no processo de ter instalado cursos em parceria com a Unipac.

Entre 2001 e 2003, Diva foi sócia da Educare, responsável pela abertura e funcionamento de cursos seqüenciais ¿ espécie de cursos de graduação mais curtos ¿ oferecidos pela Unipac em Juiz de Fora (MG). A empresa, entretanto, nunca recebeu autorização do poder público para criar cursos de nível superior e, diferentemente da fundação, tinha fins lucrativos.

O Ministério da Educação diz que uma universidade não pode transferir a outra entidade a tarefa de ensinar. É o que entende também o Conselho Estadual de Educação de Minas Gerais, responsável pelo credenciamento da Unipac. Para o Ministério Público, porém, o problema vai além da questão educacional.

¿ Uma fundação tem de cumprir a sua finalidade e não pode delegar isso a outra entidade. A situação fica insustentável à medida em que a empresa visa ao lucro, enquanto a fundação não tem fins lucrativos ¿ disse a promotora Valma Leite da Cunha, responsável pela tutela das fundações em Minas.

Os termos da parceria entre Fupac e Educare foram estabelecidos num ¿acordo de gestão administrativa¿ em que consta a assinatura do deputado Bonifácio de Andrada como testemunha. O contrato fala em cooperação para ¿implementação de cursos¿ e diz que a Educare deve repassar à fundação o dinheiro para pagar o salário dos professores e preparar o quadro de freqüência para a elaboração da folha de pagamento. Diz também que fiscais da fundação podem verificar in loco os ¿procedimentos administrativos, financeiros, contábeis e pedagógicos executados pela Educare¿.

Educare repassaria 20% da receita bruta todo mês

O acordo não prevê pagamentos da fundação à empresa, como normalmente ocorreria numa típica terceirização de serviços de segurança ou limpeza. O contrato diz que a Educare é quem repassaria mensalmente à Fupac 20% da receita bruta com mensalidades, além de bancar despesas de pessoal e custeio. O resto era o lucro da empresa.

O mecanismo não estaria restrito à unidade de Juiz de Fora. Memorando interno da Unipac assinado pelo pró-reitor Administrativo e Financeiro, Paulo José de Araújo, e endereçado ao reitor em 24 de outubro de 2002, alerta para a ilegalidade. ¿Todo o sistema é operacionalizado diretamente pelas entidades contratadas, sem qualquer participação ou controle de nossa parte¿, diz o documento. ¿Esse procedimento não está devidamente amparado na legislação educacional, porque evidencia uma clara terceirização das faculdades como um todo (administrativo e pedagógico), o que poderá colocar-nos em situação muito delicada perante o MEC e outras entidades responsáveis pela fiscalização do ensino no país, o que necessita ¿ como já lembrou o nosso reitor ¿ de urgente alteração nos convênios, que estão assim irregulares¿.