Título: Pausa para avaliar
Autor: Míriam Leitão
Fonte: O Globo, 19/04/2005, Panorama Econômico, p. 20

O que fará o Copom neste abril? Na última reunião, ele deu sinal de que pode parar de subir os juros, mas que tudo dependeria da situação externa. Nos últimos dias da semana passada, as bolsas caíram. Temores em relação à economia americana ¿ do déficit público à saúde das empresas ¿ provocaram efeitos nos mercados. O petróleo permaneceu volátil. Mesmo assim, não há razão alguma para elevar de novo os juros brasileiros. Mesmo os poucos que não criticam a política monetária estão esperando que os juros fiquem estáveis neste mês de abril.

Das várias razões para os juros não subirem, estão estas:

Houve alguns sinais de que a economia está em desaceleração. O mais recente deles, a Pesquisa Mensal de Comércio do IBGE, mostrou um resultado pior do que o esperado pelos analistas. As vendas cresceram apenas 1,3% em fevereiro em relação ao mesmo mês do ano anterior. As expectativas dos bancos eram de um crescimento de 5,9%; eles fizeram os cálculos e mostraram que as vendas caíram 3,5% em relação ao mês imediatamente anterior. O Bradesco divulgou no seu Boletim Matinal que ¿o que se pode dizer é que o crescimento acelerado e ininterrupto observado até o final do ano passado já chegou ao fim¿. A Produção Industrial caiu em março em todas as categorias de uso, expressão que o IBGE utiliza para os setores. O único que teve aumento foi o de automóveis e celulares, mas puxado pelas exportações.

As projeções para períodos de 12 meses ou mais, no modelo do Banco Central, mostram uma convergência para a meta. No modelo do BC, se os juros não caírem, a inflação para o fim de 2006 estará abaixo da meta. Isso indica que, dentro de alguns meses, o caminho será de reduzir as taxas de juros.

O dólar tem caído demais. Nas semanas em que o Banco Central não entrou comprando, nem no mercado à vista, nem no mercado futuro, houve uma queda do dólar para níveis perto de R$2,50. Apesar de todas as considerações sobre o fato de que a queda do dólar é generalizada e que a competitividade das exportações é fator de causas múltiplas ¿ e não apenas da relação real-dólar ¿ o fato é que, em algum momento, o câmbio pode afetar nossas exportações, setor do qual saem várias das boas notícias que a economia brasileira tem.

A inflação subiu nas últimas semanas em alguns índices, mas está claro que são razões bem sazonais, como a elevação de tarifas de ônibus e água. As projeções de inflação feitas pelo mercado subiram em todas as semanas desde a última ata do Copom e o núcleo do IPCA não caiu; isso poderia levar à conclusão de que seria hora de elevar os juros de novo. Contudo, o número dos produtos que respondem as leis do mercado caiu sim um pouco. Se elevasse os juros, o Banco Central provocaria mais efeitos nocivos do que bons, como a apreciação ainda maior do câmbio e queda ainda maior do nível de atividade, elevação do custo fiscal da política monetária. Teria todos esses efeitos colaterais para uma pequena recompensa de alguma queda na inflação do ano-calendário. O CSFB acha que pode haver uma queda expressiva da inflação em maio e junho. Se isso se confirmar, ele manterá sua previsão de inflação do ano, que está abaixo da do mercado, em 5,5%.

O petróleo continua instável e, definitivamente, pulou de patamar nos últimos meses para um nível acima de US$50, o barril. No relatório de março, a Agência Internacional de Energia, no entanto, disse que estava menos preocupada que nos meses anteriores com a alta do petróleo. O relatório semanal do Banco Itaú, relaciona os motivos dessa nova visão da AIE: acabou o inverno dos países do Norte, a Opep está aumentando a produção, os estoques estão maiores e a China está reduzindo o ritmo de crescimento da demanda: nos dois primeiros meses do ano passado, o consumo de petróleo daquele insaciável país cresceu 20%; no primeiro bimestre de 2005, 5%. É bem verdade, lembra o relatório do Itaú, que o FMI avisou que o mundo vive um choque permanente de petróleo e que, durante muitos anos, os preços do produto ficarão altos. Mesmo assim, a partir do comunicado de março da AIE, os preços do petróleo no futuro se estabilizaram.

E, por fim, a última, mas não menos importante razão: o Brasil virou um bicho esquisito no mundo. Compare-se o Brasil apenas com países emergentes e o resultado é surpreendente. Somos aquele soldadinho que marcha errado no batalhão. Os juros caem ou estão em níveis extraordinariamente baixos no resto do mundo; e só nós empreendemos uma puxada violenta dos juros nos últimos meses. A Turquia, vice-campeã, derrubou os juros quatro vezes este ano; de 18% foi para 15%.

A hora é de parar para analisar melhor o ambiente, avaliar mais cuidadosamente o efeito das decisões tomadas nos últimos meses. Os juros devem ficar onde estão.