Título: Lula promete carinho a militares
Autor: Cristiane Jungblut
Fonte: O Globo, 20/04/2005, O País, p. 3

Num momento em que aumentam as pressões dos militares pela concessão de um reajuste de 23%, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu ontem trabalhar ¿com vontade política e carinho¿ pela recuperação salarial nas Forças Armadas. Durante cerimônia de apresentação dos novos oficiais-generais das Forças Armadas, no Palácio do Planalto, Lula reconheceu que nos últimos anos houve um desmonte no soldo dos militares e nos salários dos servidores civis.

No ano passado, o governo deu reajuste de 10% aos militares em 1 de setembro e o então ministro da Defesa, José Viegas, prometeu um novo reajuste de 23% no início deste ano, o que não ocorreu até agora. Ontem, em seu discurso, o presidente elogiou a disciplina das Forças Armadas, afirmando que os militares têm cumprido suas funções sem reclamar.

Lula participou das comemorações do Dia do Exército. Em mensagem lida pelo locutor oficial, reconheceu a necessidade de ¿recuperar o poder aquisitivo de todos aqueles que trabalham na defesa da Nação, dando a eles salário digno e justo¿. Na mensagem, Lula disse ainda que só com a recuperação do poder aquisitivo de quem ¿trabalha na defesa da nação é que o Estado voltará a ser um verdadeiro Estado democrático e republicano¿.

¿ Quero que vocês saibam que vamos trabalhar, não apenas com vontade política, mas com carinho, para ver se encontramos uma fórmula não apenas de discutir a questão salarial, mas de discutir a recuperação das Forças Armadas brasileiras. Uma das coisas pelas quais um país é medido é pelo potencial de defesa que tem, pela preparação de suas Forças Armadas ¿ disse Lula, diante dos oficiais-generais recém-promovidos.

Sem data para o reajuste

Apesar de sinalizar com a concessão de aumento salarial, o presidente não fixou prazo para resolver o problema:

¿ Temos discutido com o ministro da Defesa e com os comandantes como trabalhar para que a gente possa recuperar o prejuízo que as Forças Armadas sofreram durante tantos e tantos anos de desmonte. Se não bastasse o desmonte da máquina pública, temos o grande desmonte, eu diria, no soldo e no salário tanto do servidor público civil como do servidor público militar. Como se essas pessoas não tivessem famílias, não tivessem gastos, não tivessem que pagar escolas.

Lula disse ainda que o Brasil não poderá ajudar as Forças Armadas de outros países, citando alguns países africanos, se os militares brasileiros não receberem ¿aquilo que merecem e aquilo que precisam¿:

¿ Vamos ter que dedicar nossa inteligência, criatividade e disposição política para que juntos a gente possa fazer com que as nossas Forças Armadas voltem a ser as Forças Armadas que tenham não apenas a recompensa salarial, mas a recompensa dos bens materiais necessários para que a gente possa (fazer) valer a grandiosidade que o Brasil hoje tem no mundo.

Dívida social secular

Lula elogiou várias vezes a disciplina dos militares e lembrou que eles fazem serviços sociais e não apenas ações militares:

¿ Não teve qualquer momento nestes dois anos e quatro meses de governo que tenhamos dado uma tarefa às Forças Armadas que não tenha sido cumprida sem perguntar, sem reclamar.

No discurso, o presidente ainda reconheceu a defasagem salarial dos servidores civis federais. E admitiu que não terá como pagar toda a dívida social com os pobres durante seu governo. Lula, que assumiu a Presidência em 2003 prometendo três refeições ao dia para todos, disse que as dívidas com os mais pobres são seculares:

¿ O Estado brasileiro precisa definitivamente reconhecer os valores dos servidores civis e militares que dedicam praticamente sua vida inteira a serviço da nossa nação. Há uma dívida com os pobres deste país de mais de século, e nós não vamos conseguir recuperar isso em dois ou três anos.

Depois da cerimônia, o comandante do Exército, Francisco Albuquerque, aprovou o discurso do presidente:

¿ Gostei, a palavra do presidente foi excelente ¿ disse o general.

Na semana passada, enquanto o presidente estava na África, o ministro da Defesa, José Alencar, e o chefe da Casa Civil, José Dirceu, reuniram-se com a cúpula militar. Dirceu reconheceu a necessidade de aumento, mas disse que o prazo, o valor e a data seriam decididos por Lula.

O ex-ministro Viegas fez a promessa de um novo reajuste de 23% em setembro, mas foi demitido em novembro. Alencar, que assumiu em seu lugar, disse que a promessa não foi feita por ele. Já a área econômica tem dito que não há dinheiro para um reajuste.