Título: BC surpreende e eleva juros
Autor: Geralda Doca, Patricia Eloy e Vagner Ricardo
Fonte: O Globo, 21/04/2005, Economia, p. 17

Oitava alta consecutiva leva o país a ter taxa real acima de 13%, a maior do mundo

OComitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu ontem, por unanimidade, e pelo oitavo mês consecutivo elevar os juros básicos da econômica (Taxa Selic), de 19,25% para 19,5% ao ano. A seqüência de alta dos juros ¿ que começou em setembro ¿ continua sendo a mais prolongada nos dez anos de história do Copom. O atual nível da Selic é o maior desde setembro de 2003, quando a taxa estava em 20% ao ano.

Novamente, a nota do Copom, divulgada depois da reunião, repetiu a frase dos meses anteriores: ¿Dando prosseguimento ao processo de ajuste da taxa de juros básica da economia, iniciado em setembro de 2004, o Copom decidiu por unanimidade elevar a taxa para 19,5%, sem viés¿.

Com a alta de ontem, o juro real da economia brasileira ¿ isto é, a taxa anual descontada a inflação projetada para os próximos 12 meses ¿ atingiu 13,3%. Com isso, o Brasil sustenta por mais um mês o título de economia com o maior juro real do mundo. A taxa é quase o dobro do segundo colocado no ranking global (Turquia, com 7,3% de juros reais) e seis vezes e meia a média dos países emergentes (2% ao ano).

Embora boa parte do mercado apostasse na manutenção da taxa, diante da indicação da ata da última reunião do Comitê de que o ciclo de ajuste teria chegado ao fim, a alta de 0,25 ponto percentual não estava descartada por analistas, desde que os índices de inflação divulgados nas últimas duas semanas registraram aceleração da variação dos preços.

Centrais e empresas condenam alta

O BC vinha indicando, tanto no Relatório Trimestral de Inflação quanto nas últimas atas do Copom, que estava mirando os 12 meses seguintes e não mais a inflação do ano-calendário. Isso gerou a expectativa de que o ciclo de ajuste dos juros havia chegado ao fim no mês passado. Mas não só a previsão para o IPCA ¿ que orienta o sistema de metas do governo ¿ vinha subindo para 2005 como começou a se mover para cima também em relação aos 12 meses para a frente. O mercado prevê 6,10% para 2005 ¿ contra meta de 5,1% e teto de 7% ¿ e 5,58% para o período entre abril de 2005 e março de 2006 ¿ contra meta de 4,5%.

Para o economista Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central, com juros reais acima de 13% ao ano, a tendência é de uma aceleração na entrada de capital especulativo e de curto prazo no país:

¿ E esse tipo de dinheiro vai embora tão rápido quanto vem, mas com um saldo de maior nervosismo no mercado de capitais brasileiro. Quem sai perdendo é o país.

Entidades empresariais e de trabalhadores criticaram a decisão do Copom. Já pela manhã, os trabalhadores cobravam do presidente Lula, que compareceu a Congresso Internacional de Sindicalistas, um freio no aperto da política monetária. O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Luiz Marinho, disse que os juros angustiam a população. O secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna, afirmou que a taxa alto prejudica a distribuição de renda.

¿ O problema dos juros é uma angústia para todos os brasileiros e brasileiras, para todos os que torcem para que a economia continue crescendo e eu estou confiante no crescimento ¿ disse Marinho.

Em nota, o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, condenou o BC: ¿Antes de manter as taxas em patamares estratosféricos, o governo precisa entender a perversa equação de que com juros altos, não há consumo, e sem consumo não há produção, resultando em mais desemprego¿.

À noite, após a decisão do Copom, Paulinho classificou de absurda a nova alta, garantindo que a elevação vai comprometer o crescimento econômico e a geração de empregos:

¿ O governo está se perdendo e partindo para uma política suicida¿ disse ele, para quem os juros altos só vão favorecer o sistema financeiro nacional e internacional, prejudicando duramente os setores produtivos.

O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) classificou a decisão do Copom de frustrante, decepcionante e preocupante. Segundo ele, o preço dessa decisão será uma diminuição ainda maior do ritmo de crescimento da economia, principalmente no segundo semestre:

¿ Havia uma expectativa de que, finalmente, o governo interromperia o aperto da política monetária. Fomos surpreendidos.

Firjan: crescimento em 2006 foi afetado

Para a Federação das Indústrias do Estado do Rio (Firjan), a nova alta da Selic não só afetará o crescimento deste ano, como o de 2006. A nota da entidade acrescenta que ¿já ocorre desaceleração da economia, devido aos elevados de juros reais¿.

O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, disse que a alta dos juros básicos para 19,50% ao ano, frustrou a sociedade, os empresários e os trabalhadores. Ele destacou que a Selic e a TJLP elevadas, combinadas com altos impostos e câmbio sobrevalorizado, estão entre os fatores que ceifam a competitividade do Brasil.

Para o Sindicato das Financeiras do Estado do Rio de Janeiro (Secif-RJ) a última ata do Copom deixou claro que o ciclo de alta dos juros estava muito perto do fim. A elevação de 0,25 ponto percentual mostra que este deve ter sido o último aumento ajuste de taxa do atual ciclo. Agora, é esperar o mês de maio para conferir.