Título: `JOSEPH QUER A ABERTURA DA IGREJA¿
Autor: Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 22/04/2005, O Mundo, p. 24

Irmão rejeita fama de conservador do Papa Bento XVI e se preocupa com divisão da Igreja

Georg Ratzinger, de 81 anos, mal consegue enxergar. Por isso abandonou a regência do coral da catedral de Regensburg, um dos mais famosos da Alemanha. Mas, no dia seguinte à eleição de seu irmão, o Papa Bento XVI, comemorou como qualquer um. Sua casa era um mar de flores e fotos do irmão mais novo e famoso. Simpático, o padre Georg vê no pontificado de Bento XVI a chance de ele mostrar ao mundo que não é conservador.

O senhor fica preocupado quando ouve críticas a seu irmão?

PADRE GEORG RATZINGER: Fico apreensivo e não consigo compreender essa diferença enorme entre a imagem negativa que tem em alguns círculos e o que ele é realmente. O meu irmão nunca foi esse conservador radical que dizem. Joseph sempre defendeu o diálogo, a abertura da Igreja. Quando era professor de teologia, valorizou também a teologia dos protestantes. Mas ninguém pode esperar que ele modifique radicalmente a Igreja, abandone todos os dogmas e tabus, porque para isso ele não tem poder. Ele é apenas o Papa, não é Jesus Cristo.

A feminista Alice Schwarzer conclamou católicas alemãs a abandonarem a Igreja. O senhor vê perigo de racha?

PADRE GEORG: Vivemos em clima de perigo constante de divisão da Igreja, mas a única coisa que podemos fazer é rezar. Não é possível atender a todos os desejos de liberalização. Mas eu vejo no conflito atual um grande desafio para o novo Papa e rezo para que ele seja iluminado para encontrar as respostas certas.

Muitos brasileiros se decepcionaram com a eleição de Bento XVI porque esperavam um Papa brasileiro, mais capaz de compreender os problemas do Terceiro Mundo. Que mensagem o senhor acha que o seu irmão Bento XVI tem para a América do Sul?

PADRE GEORG: Sua mensagem é clara. Joseph quer a abertura da Igreja, quer a Igreja da solidariedade, a Igreja que não esquece os pobres. Mas isso não significa que ele queira ou seja capaz de fazer da Igreja uma instituição política.

O Papa Bento XVI é visto como o mais brilhante teólogo da Igreja. Na sua infância, dava para notar que tinha ao lado alguém tão inteligente?

PADRE GEORG: Ele sempre teve uma inteligência genial, gostava de rezar, mas, no mais, era uma criança inteiramente normal e, por isso, entende bem as pessoas. Gostava de brincar e ainda me lembro de brigas constantes que tínhamos um com o outro.

Quem resolveu ser padre primeiro?

PADRE GEORG: Eu. Nossos pais eram bastante religiosos e viram com orgulho nossa decisão. Pouco depois de eu entrar no seminário, Joseph me seguiu. Fez sucesso muito cedo, como professor de teologia. Para mim, o mais importante foi sempre a música litúrgica, enquanto Joseph amava o estudo das questões mais importantes da teologia.

Há poucos dias, o senhor disse que seu irmão não seria eleito por causa da idade. O que motivou a escolha dos cardeais?

PADRE GEORG: Isso ele não me disse, mas eu suponho que tenha sido o interesse em continuidade, a certeza de que Joseph vai fazer tudo para preservar a herança de João Paulo II, que tanto admirava.

Qual foi o assunto da última conversa de vocês?

PADRE GEORG: Liguei para dar os parabéns. Foi um momento muito especial. Mas tenho medo também. Perdi o irmão que ainda tinha tempo para me visitar.

O senhor acha que um Papa alemão aumentará o interesse dos europeus pela Igreja?

PADRE GEORG: Não pelo fato de ser alemão. Até achava que isso seria um obstáculo. Mas Joseph está há tantos anos em Roma que talvez muitos cardeais o tenham visto um pouco como se fosse italiano. De qualquer forma, o fato de ser alemão não foi obstáculo e isso me deixa feliz. Mostra que os traumas do passado, da guerra, foram superados.