Título: Dom Cláudio prega diálogo entre Papa e bispos
Autor: Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 22/04/2005, O Mundo, p. 24

Arcebispo de São Paulo diz esperar que Bento XVI dê atenção aos continentes pobres e visite logo o Brasil

Gina de Azevedo Marques

CIDADE DO VATICANO. O cardeal-arcebispo de São Paulo, Dom Cláudio Hummes ¿ um dos quatro cardeais brasileiros que participaram do conclave ¿ defendeu ontem maior abertura no diálogo entre os bispos e o Papa Bento XVI. João Paulo II costumava realizar sínodos (encontros com os bispos) a cada cinco anos. Mas muitos acham que essas reuniões só servem para reforçar o controle do Vaticano sobre líderes católicos nos países. Para Dom Cláudio, é hora de mudar.

¿ É possível desenvolver muito mais a colegialidade (participação dos bispos nas decisões da Igreja). Há os que acham que a metodologia dos sínodos deve mudar, e talvez seja bom ter uma revisão dessa metodologia ¿ disse o cardeal.

Segundo Dom Cláudio, este é um desafio para o futuro, juntamente com o combate à pobreza, a propagação da fé na Ásia e a solidariedade e a paz no mundo. Perguntado se a teologia da libertação teria espaço no pontificado de Bento XVI, que, como cardeal, podou todas as alas rebeldes da Igreja, o cardeal respondeu:

¿ Eu diria que o momento histórico forte da teologia da libertação já passou.

Cardeal lembra encontro com Luis Carlos Prestes

Dom Cláudio admitiu, porém, que a teologia da libertação continua presente ¿com seus livros, suas produções¿, e que teólogos a defendem. Também reconheceu que ¿certos valores¿ dessa corrente ¿ sobretudo questões de justiça social e pobreza ¿ foram integradas à agenda da Igreja.

¿ O que sempre foi combatido, e estou plenamente de acordo com isso, é o uso da análise marxista como sendo uma análise científica na teologia.

Para o cardeal, a queda do comunismo na Europa mostrou que a teologia da libertação não era científica. Ele lembrou seu primeiro encontro com o líder comunista Luis Carlos Prestes, em 1996, numa reunião de operários, para comemorar o 1º de maio. Na época Dom Claudio era bispo de Santo André.

¿ Antes de mim, falou Luiz Carlos Prestes, que já estava idoso. Eu subia ao palco, quando ele descia. Eu o saudei. Tinha que dizer algo a ele, porque eu era o bispo. E eu disse: Luis Carlos, eu estou aqui pela causa de Jesus Cristo. E ele me olhou: e eu, em nome da ciência. Ele tinha a convicção de que o marxismo era científico.

Cotado antes do conclave como um dos favoritos para se tornar Papa, Dom Cláudio comentou a expectativa que muitos tinham de que o sucessor de João Paulo II fosse da América Latina ou da África.

¿ Eu pessoalmente sempre disse que não me parecia que fosse uma coisa importante de onde vem ou não vem o novo Papa ¿ afirmou.

O cardeal disse esperar que o Papa dê atenção especial aos continentes pobres, e que adoraria visitasse logo o Brasil.

Atribuindo suas informações a cardeais, jornais italianos disseram que Bento XVI obteve pelo menos 107 dos 115 votos no conclave. Em 1978, segundo o ¿Corriere della Sera¿, João Paulo II teria obtido 97 dos 108 votos.

Alguns jornais asseguraram que o cardeal Carlo Maria Martini, arcebispo emérito de Milão, da ala progressista, teria superado por alguns votos o alemão Ratzinger na primeira votação. Se isto é verdade, o que ninguém conseguiu explicar é como Ratzinger mudou o jogo. A hipótese levantada é de que Martini teria convencido seus aliados a votar no alemão, por meio de algum tipo de compromisso.