Título: Equador: limites da ação do Brasil
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 23/04/2005, Panorama Político, p. 2

Embora o chanceler Celso Amorim vá em breve ao Equador tentar colaborar para a normalização democrática, o Brasil não irá além disso e do asilo político ao presidente deposto, Lucio Gutiérrez. Não repetirá iniciativas como a que tomou em relação à crise da Venezuela há dois anos.

Gutiérrez ligou pessoalmente para o presidente Lula, de dentro da embaixada do Brasil, usando seu próprio celular, alegando a inconstitucionalidade de seu afastamento pelo Congresso e expondo seu desejo de reassumir o poder. Segundo fontes do Itamaraty, Lula foi muito franco ao apontar os limites do papel que o Brasil pode ter neste caso, embora reiterando a concessão do asilo político, nos termos do tratado neste sentido do qual o Brasil é signatário. É o que está dizendo Celso Amorim, esclarecendo que isso não significa qualquer manifestação de apoio político ao presidente deposto ou qualquer restrição aos acontecimentos internos. Para que o país alcance a normalização democrática, poderá contar depois com a ajuda da OEA e dos países do Conselho Sul-Americano, que o Brasil integra.

Pois agora, ainda que se possa questionar a constitucionalidade da iniciativa do Congresso equatoriano, dizem os diplomatas brasileiros, Gutiérrez foi o primeiro a violar a Constituição ao declarar o estado de sítio e destituir os membros da Suprema Corte, deflagrando os protestos e o verdadeiro ambiente de convulsão que levou a seu afastamento.

Aponta-se ainda uma diferença essencial em relação à situação de Chávez naquele momento de crise na Venezuela. Embora tenha enfrentado forte oposição e até mesmo uma tentativa de golpe militar, Chávez tinha amplo apoio da população, que foi às ruas em defesa de sua permanência. O Grupo de Amigos da Venezuela, uma iniciativa do Brasil, facilitou o acordo interno que levou ao referendo e à legitimação de sua permanência.

Já no Equador, pelo contrário, Gutiérrez está completamente isolado, ao ponto de os manifestantes estarem cercando a embaixada brasileira para evitar sua retirada do país. E com isso, atrasando a concessão do salvo-conduto pelo governo que assumiu.

O desfecho da crise no Equador não chegou a surpreender o governo brasileiro, que a vinha acompanhando com atenção através dos relatórios da embaixada. Mas é ruim, muito ruim para a América do Sul esta visita da instabilidade e da ruptura ao continente que tem se esforçado para consolidar a experiência democrática.