Título: EM DOIS DIAS, 232 BRASILEIROS PRESOS TENTANDO ENTRAR NOS EUA
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 23/04/2005, O País, p. 8

Seis crianças estão entre os detidos no sul do Texas; agentes da Patrulha de Fronteira se dizem surpresos com o número crescente de imigrantes clandestinos do Brasil

WASHINGTON. Até mesmo os mais experientes agentes da Patrulha de Fronteira, dos Estados Unidos, estão surpresos com o crescente número de brasileiros que vêm sendo apanhados ao entrar no país ilegalmente nos últimos meses. O recorde foi atingido na última quarta-feira, quando 149 foram detidos no sul do Texas. Menos de 24 horas depois, anteontem, mais 83 foram agarrados pelos policiais na mesma região. Ao todo, foram 232 brasileiros presos em dois dias, entre eles seis crianças.

¿ Não temos a menor idéia por que tantos brasileiros estão vindo para cá clandestinamente. A continuar nesse ritmo, o número aumentará ¿ disse o porta-voz da patrulha no posto de McAllen, Roy Cervantes.

De outubro a março, 58 brasileiros detidos por dia

De acordo com os registros oficiais nada menos do que 10.554 brasileiros foram detidos ao entrar ilegalmente nos EUA no período entre outubro de 2004 e março de 2005. Uma média de 58 por dia. Segundo os especialistas no setor, na prática isso significa que o índice de brasileiros que chegam e conseguem ludibriar a vigilância na fronteira é bem maior: a estimativa é de para cada um dos detidos, pelo menos outros três conseguem escapar da vigilância.

Atualmente há 31.974 à espera de uma audiência com um juiz de imigração. E o consulado do Brasil em Houston, no Texas, também acredita que a tendência é de, a cada dia, chegarem mais imigrantes.

As detenções de brasileiros na quarta e na quinta-feira aconteceram em seis pontos distintos do sul do Texas, desde as margens do Rio Grande ¿ linha divisória entre o México e os EUA ¿ até uma estrada perto de um lugarejo a 48 quilômetros de McAllen, onde há uma sede da Patrulha de Fronteira.

¿ Eles foram apanhados aleatoriamente. Não estávamos buscando especificamente os brasileiros. Acontece que eles chegavam em grupos grandes e isso facilitou a localização de seus movimentos, tanto pelo nosso pessoal no solo quanto pelos nossos helicópteros ¿ disse Cervantes.

Entre os cidadãos de todos os países, os brasileiros formam o grupo em que mais tem crescido o número de detenções. O aumento foi de 1.665% nos últimos cinco anos (de cerca de 500 em 1999 para 8.600 em 2004).

Poucos vão para a cadeia. Quando se trata de mexicanos, eles são levados a um posto de fronteira e deportados. No caso dos brasileiros, e de outras nacionalidades, a Patrulha de Fronteira primeiro verifica em seus computadores se o invasor é reincidente, se está fichado na polícia e se é uma ameaça à segurança nacional.

Quem tem onde ficar, espera até ser notificado

O reincidente vai diretamente para a prisão, aguardar a deportação. Quem é considerado inofensivo é liberado provisoriamente. Para isso, no entanto, é preciso que o detido forneça um endereço fixo de um amigo ou familiar nos EUA. Ele, então, é orientado a aguardar nesse lugar uma notificação judicial, com a data para uma audiência com um juiz de imigração. E assina um documento prometendo cumprir essa convocação:

¿ Essa espera geralmente demora até seis meses. E nesse tempo a pessoa não pode trabalhar ¿ disse a encarregada de Assistência a Brasileiros no consulado do Brasil em Houston, Alba Castro Alves.

Quem não tem um endereço fixo para fornecer às autoridades vai diretamente para a prisão, aguardar a deportação ¿ o que em geral significa também uma espera de até seis meses. Numa audiência o juiz pode permitir à pessoa deixar o país voluntariamente, pagando ela mesma a sua passagem de volta ao Brasil. O prazo para que apresente a passagem é de três semanas. Quem diz não ter fundos suficientes para isso é mandado, então, para a cadeia, para aguardar a deportação, por conta do governo americano.

¿ Em determinados casos, logo depois da detenção o juiz estipula uma fiança como condição para liberar o imigrante ilegal. Ela varia de US$20 mil a US$35 mil. A pessoa tem de depositar, na hora, apenas dez por cento. O resto é financiado. O problema é que a maioria já chega quase sem nada nos bolsos ¿ explicou Alba.

Na prática, porém, a maioria das pessoas apanhadas pela Patrulha de Fronteira, e autorizadas a aguardar uma audiência em liberdade, nunca mais aparece: 70% delas simplesmente caem na clandestinidade dentro dos EUA.