Título: PAPA CONDENA LEI ESPANHOLA PARA UNIÃO GAY
Autor: Deborah Berlinck, Monica Yanakiew, Gina A. Marques
Fonte: O Globo, 23/04/2005, O Mundo, p. 28

Em seu primeiro encontro com os cardeais, Bento XVI diz que trabalhará com simplicidade, e não com honras

Gina de Azevedo Marques

CIDADE DO VATICANO. Respondendo com firmeza ao que foi considerado o primeiro desafio do Papa Bento XVI, o Vaticano condenou ontem duramente a aprovação na Espanha de uma lei que autoriza o casamento de homossexuais e a adoção de crianças por casais gays. O jornal oficial da Santa Sé, ¿L¿Osservatore Romano¿, disse que ninguém tem o direito de alterar a essência e a identidade do matrimônio, e que a aprovação da lei ¿suscita alarme nas comunidades religiosas não apenas católicas e em amplos setores da sociedade civil¿.

A condenação da Igreja à lei ¿ aprovada em primeira votação na Câmara de Deputados espanhola e que ainda será submetida ao Senado ¿ foi expressada também pelo cardeal colombiano Alfonso López Trujillo, presidente do Conselho Pontifício para a Família. Em declaração ao jornal italiano ¿Corriere della Sera¿, ele considerou a lei inumana e ¿fruto de uma estranha idéia de modernidade¿. ¿Não se pode impor coisas injustas aos povos¿, afirmou.

Trujillo lembrou que o atual Papa ¿sempre disse com clareza que essa lei é destrutiva e abre caminho para a desumanização¿. No ano passado, o então cardeal Joseph Ratzinger, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, afirmou que a decisão do governo espanhol ¿ que encaminhara a lei ao Congresso ¿ era negativa e destruía a família e a sociedade.

Possibilidade de divorciados receberem comunhão

O jornal ¿La Stampa¿ disse que um documento anônimo com duras críticas ao mau comportamento de padres teria circulado entre os cardeais dias antes do conclave, levando-os a se inclinar a favor de Ratzinger. O documento abordaria problemas em Europa, África e América do Norte, entre os quais pedofilia e violação do segredo de confissões.

Já o ¿La Repubblica¿ disse que antes de deixar a chefia da Congregação para a Doutrina da Fé Ratzinger preparou quatro documentos que indicariam uma abertura da Igreja. Um deles abordaria a possibilidade de católicos divorciados que se casaram novamente receberem a comunhão. Outros dois serviriam de base para o diálogo entre religiões: abordariam o trabalho do Papa e a natureza divina de Cristo. O quarto proporia o aumento da idade de aposentadoria dos bispos de 75 para 80 anos.

Três dias depois de eleito, Bento XVI teve ontem seu primeiro encontro com os cardeais. Apesar de seus poderes de monarca absoluto, disse que tem limitações e precisa da colaboração de todos ¿ um sinal de sua disposição para o diálogo dentro da Igreja.

O tom foi de súplica:

¿ Eu imploro a vocês. Nunca me privem de seu apoio.

Em seu primeiro encontro com os 115 cardeais que o elegeram e outros que por serem muito idosos não participaram do conclave, Bento XVI afirmou que quer servir, e não receber honras.

¿ Não se trata de honras, mas sim de um serviço a ser cumprido com simplicidade e dedicação ¿ afirmou.

Dom Geraldo pediu bênção para os brasileiros

Desde sua eleição, o Papa tem enfatizado suas fraquezas e sua humildade, desfazendo a imagem de conservador implacável que ganhou durante os 23 anos em que foi guardião da doutrina católica. Ontem, ao pedir apoio aos cardeais, disse ter um ¿senso de impotência humana¿ diante de sua enorme tarefa.

O arcebispo do Rio, Dom Eusébio Scheid, declarou:

¿ Ratzinger é culto, muito delicado, humano, atentíssimo e muito chegado a nós.

Bento XVI cumprimentou os cardeais um a um com um sorriso paterno. Eles beijaram seu anel e tiraram fotos. O arcebispo de Salvador, Dom Geraldo Majella Agnelo, disse que pediu a ele ¿ e recebeu ¿ uma benção para o povo brasileiro. Já Dom Claudio Hummes, arcebispo de São Paulo, declarou que o Papa ¿nada tem de distante¿.