Título: PFL e PSDB: dando um tempo
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 24/04/2005, Panorama Político, p. 2

Pefelistas e tucanos, velhos amigos, andam se queixando uns dos outros desde que, no mês passado, o governador paulista Geraldo Alckmin levou um tombo na Assembléia Legislativa com a eleição do pefelista Rodrigo Garcia para a presidência. Com a ajuda do PT, ele derrotou o candidato do governador.

Os pefelistas já não assumem integralmente a defesa do governo Fernando Henrique e comparam criticamente a política de Palocci com a de Pedro Malan. A conversa sobre candidatura presidencial única em 2006 morreu. Pelo menos, para o primeiro turno.

No episódio da intervenção federal na saúde municipal do Rio, a solidariedade tucana custou a vir. Só depois de uma manifestação solitária do líder tucano Arthur Virgílio a executiva do PSDB resolveu se manifestar. A queixa vem pela boca do deputado Rodrigo Maia, líder do PFL na Câmara.

O estremecimento, é ele também que recorda, vem de muito antes. Começou em 2001 quando Aécio Neves enfrentou e derrotou Inocêncio Oliveira na disputa pela presidência da Câmara. Fernando Henrique fez-se de neutro. O mal-estar se agravaria com o caso Lunus, que fulminou a candidatura presidencial de Roseana Sarney, deixando nos pefelistas, até hoje, a certeza de houve ali mandinga tucana com os procuradores. E para completar, em 2002 Serra preferiu uma aliança com o PMDB, excluindo o PFL.

¿ Temos hoje apenas uma aliança tática, para fazer oposição ao governo Lula. Nossos projetos de poder são distintos, embora possamos nos aliar mais adiante, para enfrentar Lula num segundo turno ou para governar, se formos vitoriosos juntos ou separados ¿ diz o filho de Cesar Maia.

A diferença de projetos manifesta-se sobretudo na definição do papel do Estado. Os tucanos, que tanto privatizaram, voltam a falar em estado regulador (o que os aproxima mais do PT, ou este dos tucanos). Já os pefelistas retomam o culto ao Estado mínimo. Se não mínimo, esbelto, como na metáfora já conhecida de Rodrigo: ¿Como a garota de Ipanema, com curvas mas sem gorduras¿.

E mesmo na oposição ao governo Lula têm feito jogos separados. Agora mesmo, contra a MP 242, que restringe a concessão de benefícios como o auxílio-saúde e a aposentadoria por invalidez, cada qual entrou com sua ação direta de inconstitucionalidade junto ao STF.

O governador Alckmin é o mais ressentido entre os tucanos, embora faça uma força danada para reconhecer que o episódio que o vitimou teve causas meramente locais.

O líder da minoria na Câmara e ex-líder pefelista José Carlos Aleluia é mais contemporizador:

¿ Hoje é estrategicamente correto termos candidaturas diferentes à Presidência. Para Lula, quanto mais candidatos, pior.

Isso é verdade, embora se aponte sempre na unidade da oposição o dom de fortalecer no eleitorado a disposição para mudar. Disposição que hoje, segundo as pesquisas, ainda não é muito animadora para a oposição.

Preço, apoio e reeleição

Tem se dito muito, inclusive aqui, que a recandidatura do presidente Lula em 2006 é uma das causas dos problemas em sua base aliada. Se a reeleição torna os aliados mais necessários, eles aumentam o preço do apoio. E isso vale particularmente para o PMDB, com suas tantas pontas.

Lula, nas conversas sobre o assunto, tem feito outra avaliação. Acha que, se até o fim deste ano, o governo andar bem, assim como sua popularidade, as alianças sairão com naturalidade. Os apoios, como as águas, correm sempre para o mar. Se o governo estiver mal, e ele também, será tudo mais difícil e caro mesmo. Até lá, o PT pode tratar de sucessão, não o governo, que precisa é de mostrar resultados. Teria dito isso por exemplo na reunião de quarta-feira passada com Genoino, Dirceu e os líderes petistas Arlindo Chinaglia e Aloizio Mercadante.

Quando as reuniões são políticas e dizem respeito ao PT, Lula faz com que aconteçam à noite e em sua residência, a Granja do Torto. Nestes casos, a presença certa é de Dirceu. Já as que tratam de sustentação parlamentar são com Aldo Rebelo. Na cabeça de Lula, pelo visto, não existe a tal ambivalência na Coordenação Política, com Aldo e Dirceu atuando na seara, embora com missões distintas. Mas, na cabeça dos aliados, a confusão ocorre, e causa problemas.

Parecia mas não era

Quando há dez dias o governo apresentou a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) com um limite de 16% do PIB para a carga tributária, muita gente soltou foguete à toa, enxergando aí um freio no Leão da Receita Federal.

Examinando melhor o que está dito na LDO, a Comissão Mista de Orçamento concluiu que estava ali um cabresto, mas para o Congresso. O que está dito, segundo nota técnica da Comissão, elaborada sobre argumentos do deputado Sérgio Miranda, é que o Congresso não poderá mais reestimar a previsão de receitas apresentada pelo governo: ¿Assim, mesmo que o Congresso identifique erros ou omissões na previsão, não poderá corrigi-los caso ultrapassem o teto fixado". E não podendo engordar a receita ¿ embora o Congresso sempre acerte ao fazer isso ¿ o sacrifício pode sobrar para as emendas dos parlamentares.

Em miúdos: Como a receita cresce inexoravelmente, a diferença é que agora o Executivo terá mais liberdade para destinar os recursos que ultrapassarem o teto dos 16%. Se quiser, pode até destinar tudo ao superávit primário, ao pagamento da dívida.

Para se ter ideia deste jogo entre Congresso e governo sobre a maré das receitas: em 2004, a arrecadação foi R$18 bilhões maior que o estimado pelo governo. E R$6,9 bilhões maior que a projeção já corrigida pelo Congresso.

O gato era lebre.