Título: `SE O BRASIL FOR BEM, A AMÉRICA DO SUL TAMBÉM IRÁ¿
Autor: Eliane Oliveira e Jailton de Carvalho
Fonte: O Globo, 28/04/2005, O País, p. 3

Fala de Nixon é comparada à de Condoleezza

¿Se o Brasil for bem, o resto da América do Sul também irá bem¿. A frase, dita em 1971 pelo presidente dos EUA Richard Nixon durante visita do presidente brasileiro Emílio Garrastazu Médici àquele país, poderia perfeitamente ter saído do discurso elogioso da secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, no encontro que teve anteontem com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Partindo dessa semelhança discursiva, o professor de história contemporânea da UFRJ Francisco Carlos Teixeira diz que as declarações dos representantes americanos mostram que ¿os Estados Unidos acham que têm papel de indutor externo nos regimes sul-americanos¿.

Teixeira explica que a fala de Nixon indicava que os EUA estariam dispostos a apoiar ditaduras na América Latina. O discurso de elogio à economia brasileira ¿ que crescia a altas taxas com forte intervenção do governo militar no início dos anos 70 ¿ ajudou a legitimar ditaduras em países como Argentina, Chile e Bolívia.

Hoje, segundo o professor, apesar das dificuldades econômicas, quando Condoleezza destaca a importância do Brasil, com sua democracia consolidada, e afirma que o país ¿caminha rapidamente para se tornar potência mundial¿, está valorizando o regime que quer ver instalado em países como Bolívia, Equador e Venezuela.

Para ele, separadas por mais de 33 anos, as duas declarações têm interesses ideológicos:

¿ Mudou o conteúdo, mas permanece a intervenção americana nos assuntos internos dos países sul-americanos. Isso é ruim. As democracias devem surgir do desejo do povo. Quando impostas, podem ser identificadas com a presença estrangeira.

O presidente do conselho de comércio exterior da Fiesp, Rubens Barbosa, ex-embaixador em Washington, afirma que a semelhança das declarações de Nixon e Condoleezza se restringe ao discurso e que os fundamentos ¿são totalmente diferentes¿. Atualmente, segundo ele, ¿o Brasil representa mais de 50% em qualquer coisa na América Latina¿. Assim, explica, Condoleezza falou com base nas estabilidades política e econômica, na política externa forte e em posições pró-ativas do país.

¿ Ela se referiu ao Brasil como potência mundial do ponto de vista econômico ¿ diz Barbosa, lembrando que em 1971 o clima era o da Guerra Fria e o do controle do comunismo na região.

O diretor do Centro de Estudos das Américas da Universidade Candido Mendes, Clóvis Brigagão, avalia que a Guerra Fria justificou a declaração de Nixon, de apoio à ditadura brasileira. Além disso, lembra, o Brasil é e sempre foi muito importante pelas proporções continentais. Mas hoje, diz, tem efetivamente o papel de líder:

¿ O Brasil, até pouco tempo, não assumia o risco de ser líder. Hoje, agradando ou não, mostra a cara no mundo. A visita de Condoleezza simboliza isso, que o país tem mesmo papel fundamental.