Título: ATENTADOS MAIS QUE TRIPLICARAM ANO PASSADO
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 27/04/2005, O Mundo, p. 28

Governo americano tenta manobra para dificultar chegada de dados sobre aumento de ataques terroristas no mundo

WASHINGTON. O presidente George W. Bush insiste em dizer que o governo dos Estados Unidos está ganhando a guerra contra o terrorismo internacional. No entanto, os dados registrados pelo Centro Nacional Antiterrorismo (NCTC, na sigla em inglês) dizem exatamente o contrário: os atos de terror na verdade mais que triplicaram no ano passado.

Eles passaram de 175, em 2003, para 655 em 2004 (274,3%). E nesse índice não chegaram a ser incluídos os ataques feitos pelos insurgentes no Iraque, e que Bush costuma definir como atentados terroristas.

Diante dessa realidade, o Departamento de Estado, ao qual caberia divulgar publicamente o índice de ataques esta semana, decidiu mantê-los em segredo - rompendo uma praxe que já durava 37 anos. Isso foi inútil e já provocou o envio de uma carta ao inspetor-geral do Departamento de Estado, Cameron R. Hume, contendo duras críticas à decisão da secretária de Estado, Condoleezza Rice, de encobrir a verdade.

A carta foi escrita pelo deputado democrata Henry A. Waxman, da Califórnia. "Parece haver um padrão de enfoque do governo em relação aos dados sobre terrorismo: fatos favoráveis são revelados, enquanto os desfavoráveis são suprimidos", diz um trecho. O parlamentar argumentou, ainda, que "a inconveniência política" de admitir que a guerra ao terrorismo não está sendo vencida "jamais foi uma base legítima para esconder os fatos do povo americano".

Os registros vinham sendo mantidos em segredo até ontem, quando assistentes de legisladores decidiram revelá-los confidencialmente a alguns repórteres.

Departamento de Estado não apresenta informações

Em vez de apresentar publicamente o informe anual "Padrões do Terrorismo Global", o Departamento de Estado entregou cópias apenas a comissões do Congresso e deixou por conta do NCTC a decisão de divulgar os dados ao público ou não.

- Eu não vou falar nada a respeito disso, mesmo porque não cabe mais a nós divulgar esses índices - disse Adam Ereli, porta-voz do Departamento de Estado.

Fontes desse ministério revelaram que a decisão partira da própria secretária Condoleezza, ao ver que os índices de atentados mais que triplicaram. Primeiro, segundo os funcionários, ela teria consultado o NCTC se não haveria uma outra metodologia para registrar os ataques terroristas. Uma mudança de critério poderia reduzir o número total.

- Quando lhe disseram que o método atual é o mais preciso, ela determinou que os dados não fossem apresentados ao público - disse uma das fontes.

Algo parecido já havia, curiosamente, acontecido no fim de abril do ano passado. O informe referente a 2003 indicava que os atentados terroristas internacionais haviam diminuído, e atribuíam isso ao fato da guerra deflagrada por Bush estar sendo vencida. No entanto, dias depois foi anunciada uma correção: o número de pessoas mortas em atentados era mais do que o dobro da cifra anunciada, e os ataques tinham atingido o índice de 175, que era o maior nos últimos 20 anos.