Título: EQUADOR QUER MANTER BOA RELAÇÃO COM OS EUA
Autor: Janaína Figueiredo
Fonte: O Globo, 27/04/2005, O Mundo, p. 29

Novo presidente afirma que nada muda em relação aos militares americanos mantidos na base de Manta

QUITO. Embora um dos motivos da queda do ex-presidente do Equador Lucio Gutiérrez tenha sido o crescente antiamericanismo entre representantes da classe média equatoriana, sobretudo da capital, Quito, o novo governo não parece disposto a romper as bases da sólida aliança entre os dois países. O presidente Alfredo Palacio confirmou sua decisão de não rever o entendimento sobre a base militar de Manta, onde atualmente vivem 500 militares americanos. Paralelamente, as negociações para a assinatura de um acordo de livre comércio serão mantidas.

- Respeitaremos todos os compromissos assumidos e isso inclui a base de Manta. Trata-se de um acordo que termina em 2009 (mas pode ser revisto antes) e só então o governo do Equador deverá decidir se mantém ou não o entendimento - afirmou Palacio, que segunda-feira recebeu a embaixadora dos EUA em Quito, Kristie Kenney, no Palácio de Carondelet.

Segundo analistas, apesar da forte expectativa que existe no país, o governo Palacio não alterará os pilares fundamentais da economia e da política externa equatoriana. Neste sentido, o relacionamento com a Casa Branca é chave. A embaixadora Kenney foi a primeira autoridade diplomática a visitar o palácio de governo após a destituição de Gutiérrez. Até ontem, o embaixador do Brasil, Sergio Florêncio, não tinha entrevista marcada com o novo presidente.

- Aspiro a que as relações entre os dois países (EUA e Equador) sejam relações entre irmãos. Essa fraternidade deve estar sustentada num tratamento entre iguais - assegurou o presidente equatoriano, que estudou nos EUA e antes de assumir a vice-presidência, em janeiro de 2003, lá passava de três a quatro meses do ano.

Equatorianos continuam deixando o país

A dolarização da economia, outra polêmica medida que enfrenta resistência em setores vinculados à esquerda equatoriana, também será mantida. A adoção do dólar como moeda nacional conseguiu conter a disparada dos preços e estabilizou a economia. Atualmente, a taxa de desemprego do Equador está em torno de 9%. Já a taxa de pobreza alcança 11%.

No entanto, apesar da normalização da economia (em 2000, o governo de Jamil Mahuad confiscou depósitos bancários em meio a uma corrida aos bancos e à hiperinflação), o custo de vida aumentou e os equatorianos continuam abandonando em massa o país. Nos últimos dez anos, 2,8 milhões de pessoas foram para Espanha, EUA, Chile e Peru, entre outros destinos.

Uma semana depois da queda de Gutiérrez, o futuro do país continua sendo incerto. Ontem desembarcou em Quito uma missão da Organização de Estados Americanos (OEA) para reunir-se com autoridades, representantes de partidos políticos e associações civis. A missão será comandada pelo presidente do Conselho Permanente da OEA e embaixador do Peru, Alberto Borea.

O objetivo da visita, informou a organização, é "colaborar com as autoridades do país e com todos os setores da sociedade equatoriana, em seu esforço para consolidar a democracia".

Palacio estaria separado da primeira-dama

Filhos moram nos EUA e família foi reunida para melhorar imagem

QUITO. Seguindo o conselho de seus assessores, o presidente Alfredo Palacio convocou seus quatro filhos e sua mulher, da qual estaria separado, para mostrar ao povo equatoriano que, além de uma sólida carreira como cardiologista, tem uma família unida e exemplar.

Segunda-feira, antes de Palacio receber a imprensa, a nova primeira-dama, Maria Beatriz Paret de Palacio, e os quatro filhos do casal, Ana Maria Palacio de Tamariz, de 34 anos, Llinka Maria Palacio de Zambrano, de 32 anos, Alfredo Inti Palacio, de 30 anos e Carola Maria Palacio, de 22 anos, deram uma entrevista aos jornais locais.

- O presidente está separado faz tempo, todos os equatorianos sabem disso. Por isso ninguém entendeu quando toda a família apareceu no Palácio de Carondelet - comentou ao GLOBO o diretor de um importante jornal de Quito.

Os quatro filhos do casal moram nos EUA, onde estudam e trabalham. O único filho homem, Alfredo Inti, é formado em literatura latino-americana e largou tudo o que estava fazendo em Miami para colaborar com o novo governo de seu país.

- Semana passada foi uma loucura, acompanhamos toda a situação pela TV. Estivemos em permanente contato com familiares e amigos que estavam em Quito. Foi muito angustiante - comentou ao GLOBO o filho do presidente, enquanto esperava para entrar na sala do pai.

A primeira-dama, que estava morando em Guayaquil, se instalou no Palácio de Carondelet para assumir o posto que os assessores do presidente lhe atribuíram. (J.F.)

BOXE EXPLICATIVO

ENTENDA A CRISE

A última crise política equatoriana começou em dezembro, quando o presidente Lucio Gutiérrez substituiu os 31 juízes da Suprema Corte com o apoio de sua base parlamentar e foi obrigado a voltar atrás por pressão popular semanas atrás. Como desdobramento dos protestos, a população passou a exigir também a renúncia de Gutiérrez, acusado de corrupção, autoritarismo e responsabilidade na morte de manifestantes. No Congresso, o presidente, que chegou a declarar estado de emergência em Quito, sofreu uma derrota domingo retrasado com a declaração de inconstitucionalidade da renovação da Suprema Corte e a oposição começou a propor seu impeachment. No dia 20, os congressistas declararam a vacância do cargo por abandono de poder. Gutiérrez, sem apoio militar, refugiou-se na Embaixada do Brasil e obteve asilo político no país.