Título: LEI FISCAL FAZ 5 ANOS E ECONOMISTAS VÊEM RISCOS
Autor: Regina Alvarez
Fonte: O Globo, 01/05/2005, Economia, p. 40

Para criadores da norma que impede governos de gastar além do que arrecadam, medida criou nova mentalidade

BRASÍLIA. A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) completa cinco anos no próximo dia 4 com amplo apoio da sociedade. Traduzida como a lei que impede o administrador público de gastar mais do que arrecada, transformou-se em um marco no controle das finanças públicas do país, especialmente em relação aos estados e municípios. Ainda assim, alguns especialistas alertam para os riscos de cumprimento da lei e propõem aperfeiçoamentos.

O caso mais notório de descumprimento é o da prefeitura de São Paulo na gestão de Marta Suplicy. Durante o seu mandato, a prefeita fez pressão para renegociar a dívida da cidade, mas não obteve respaldo, já que isso implicaria mudanças na Lei de Responsabilidade Fiscal. Na saída, recebeu uma ajuda do governo federal e conseguiu, com outras seis prefeituras, burlar um dos artigos mais importantes da LRF: aquele que proíbe a concessão de novos empréstimos para administrações que ultrapassarem os limites de endividamento.

¿ Vejo o perigo de esse exemplo da prefeitura de São Paulo virar um paradigma ¿ alerta o economista José Roberto Afonso, especialista em contas públicas e um dos pais da LRF.

Sem punições, lei pode perder força, diz economista

Na época em que as irregularidades vieram a público, o Tesouro Nacional defendeu-se afirmando que havia editado a medida provisória 237 que abria uma exceção para contratação de empréstimos, regularizando desta forma a situação da prefeitura de São Paulo e de outras seis. Procurado na sexta-feira, o secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, não retornou a ligação.

Para Afonso, os avanços da lei nas finanças públicas são visíveis e inquestionáveis, mas os desafios também são grandes no sentido de garantir a sua vigência. O economista faz duras críticas ao comportamento do atual governo em relação à prefeitura de São Paulo na gestão de Marta Suplicy, que considera leniente. Lembra ainda que falta regulamentar os limites de endividamento para a União, cuja proposta está parada no Congresso.

¿ A maior dívida (a da União) ainda permanece sem limite. A lei não foi feita só para os governos subnacionais. Vale para todos ¿ diz o economista.

O ex-ministro do Planejamento Martus Tavares, que hoje é secretário de Planejamento do estado de São Paulo, coordenou a equipe que encaminhou ao Congresso, na gestão de Fernando Henrique Cardoso, a proposta de criação da Lei de Responsabilidade Fiscal. Cinco anos depois da sua aprovação, Martus considera que a LRF mudou definitivamente a forma de os governantes gerirem as finanças públicas.

¿ Antes da lei, o governo federal acomodava a irresponsabilidade de prefeitos e governadores refinanciando suas dívidas. Isso acabou ¿ afirma o ex-ministro. ¿ A maioria dos estados e municípios está cumprindo a LRF. As exceções estão sendo denunciadas pela imprensa e julgadas pela sociedade e pelos eleitores.

Economista do Ipea teme mudanças na lei agora

Já o economista Raul Velloso acha que a lei corre o risco de perder força, caso não sejam aplicadas as punições àqueles que a estão desrespeitando. A fiscalização do cumprimento da LRF é feita pelos Tribunais de Contas, mas Velloso acha que a responsabilidade é também do Executivo e do Judiciário.

¿ O descumprimento da LRF tem que ser punido, caso contrário a lei pode perder sua força. Tornar-se letra morta ¿ diz.

Para Fábio Giambiagi, economista do Ipea, o saldo da aplicação da LRF é extremamente positivo, mas alguns aperfeiçoamentos no texto da lei seriam recomendáveis. Mesmo assim, ele acha que ainda não é o momento para propor qualquer mudança, pois o risco de retrocesso ainda é grande.

¿ O risco de mexer na lei ainda é muito grande. Seria como abrir uma caixa de Pandora. O melhor é esperar mais cinco anos ¿ afirma Giambiagi.

Na próxima quarta-feira, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso comandará uma reunião de tucanos, promovida pelo Instituto Teotônio Vilela, para festejar a lei. No mesmo dia, o Ministério da Fazenda promove o seminário ¿Os avanços e desafios da LRF¿.