Título: Lula acerta números, mas escorrega na Previdência
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Fonte: O Globo, 30/04/2005, O País, p. 9

Segundo ministério, foram criados mais empregos que na era FH

BRASÍLIA. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se mostrou afiado sobre os números de seu governo. Foi certeiro - com ajuda de uma cola no púlpito, mas de cabeça na maioria das vezes - ao discorrer sobre juros e geração de emprego. No entanto, esbarrou em uma meia-verdade: anunciou que o déficit da Previdência está caindo, embora isso tenha ocorrido apenas em março na comparação com fevereiro. Na verdade, o déficit da Previdência continua sendo questão delicada: fechou o primeiro trimestre em R$8,6 bilhões, 25,1% maior do que os R$6,9 bilhões dos primeiros três meses de 2004.

Poder de compra do mínimo também é questionável

Outro dado que pode ser questionado é o poder de compra do salário-mínimo. Lula disse que o piso comprava 1,2 cesta básica no início de 2003 e hoje compra 1,9. A partir de segunda-feira, com o reajuste para R$300, comprará duas cestas.

O Dieese não calcula médias nacionais, mas considerando-se a cesta mais cara do país em março de 2003 (Porto Alegre) o mínimo de R$200 comprava 1,2 cesta. Dois anos depois, o piso de R$260 compra apenas 1,5 cesta em São Paulo (a mais cara do período), mas 1,98 em Recife, a capital onde os itens essenciais custavam menos. Em Recife, o novo mínimo de R$300 comprará 2,3 cestas, mas no Rio, apenas 1,8.

Cobrado sobre juros, Lula tinha na ponta da língua os números que Henrique Meirelles, presidente do Banco Central, apresenta sobre as taxas de referência do mercado, já descontada a inflação: contra uma média de 10,6% ao ano em 2004 e de 13,2% em 2003, Lula corretamente disse que nos dois últimos anos de Fernando Henrique Cardoso a média esteve em 15,8%.

Em relação à criação de postos de trabalho com carteira assinada, usou a base de dados do Ministério do Trabalho. Disse que a média mensal de empregos criados nos dois mandatos de Fernando Henrique foi de oito mil (8.301, segundo o cadastro federal), contra 91 mil (91.145 na estatística oficial) entre janeiro de 2003 e março de 2005. Entre 1995 e 1999, o país apresentou saldo negativo.

Para a oposição, faltou falar das promessas

Goldman contesta dados sobre emprego

BRASÍLIA. Líderes da oposição criticaram o formato da primeira entrevista coletiva do presidente Lula e contestaram os números apresentados. Para o líder do PFL na Câmara, deputado Rodrigo Maia (RJ), Lula não se referiu às promessas de campanha não cumpridas.

- O presidente não avaliou seu erro fundamental, as promessas de campanha: os dez milhões de empregos, a diminuição da carga tributária e dobrar o valor do salário-mínimo - disse Maia (RJ).

O líder do PSDB, deputado Alberto Goldman (SP), disse que Lula fez 14 longos discursos, já que os jornalistas não tiveram direito à réplica. E contestou os números apresentados:

- Lula manipulou os números e não deu chance à contestação. Não são verdadeiros os números sobre o crescimento real do salário-mínimo e sobre o crescimento do emprego. Nem é correto comparar os juros nominalmente, mas os juros reais, que hoje são os maiores do planeta.

Segundo Goldman, os reajustes dados pelo governo ao mínimo garantiram um crescimento real de apenas 10%. Ele disse que, computados 84 meses no governo Fernando Henrique, a média mensal de empregos gerados foi de 105.952, e não oito mil como disse Lula.

Já o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), disse que Lula manteve-se tranqüilo.

- Gostei do conteúdo e da segurança com que ele desenvolveu a entrevista.