Título: NO FRONT NORTE: USAID EXIGIA CONDENAÇÃO PÚBLICA DA PROSTITUIÇÃO PARA REPASSAR VERBA AO PROGRAMA BRASILEIRO
Autor: Luiza Damé
Fonte: O Globo, 03/05/2005, O País, p. 8

Brasil recusa ajuda dos EUA contra a Aids

Ministério da Saúde alega que ação da agência americana era baseada em princípios `fundamentalistas e xiitas¿

BRASÍLIA. O Ministério da Saúde recusou uma ajuda financeira do governo dos Estados Unidos para o Programa de Doenças Sexualmente Transmissíveis/Aids que, no período de 2003 a 2008, representaria um repasse de US$48 milhões. A doação foi recusada porque a Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional (Usaid) proibiu a utilização do dinheiro em campanhas de combate à Aids envolvendo prostituição.

Em entrevista ao "Wall Street Journal", o coordenador do programa brasileiro, Pedro Chequer, justificou a recusa afirmando que a Aids não será controlada a partir de "princípios maniqueístas, teológicos, fundamentalistas e xiitas". A posição do Brasil foi formalizada na quinta-feira em carta à Usaid.

A assessoria do Programa DST/Aids informou que a decisão foi tomada depois que a Usaid mudou o texto do termo de cooperação, incluindo uma cláusula que prevê a condenação pública da prostituição.

Apesar de rejeitar a ajuda na carta enviada semana passada, o programa DST/Aids vai aguardar uma resposta dos americanos. Os técnicos do programa ainda acreditam na possibilidade de a exigência ser revista pela Usaid.

No projeto inicial de renovação da convênio, a Usaid propusera a adoção no Brasil da política do governo George W. Bush que prega abstinência, fidelidade e, se necessário, uso de preservativo.

O Ministério da Saúde discordou também dessa cláusula e a Usaid aceitou suprimi-la do convênio. O mesmo não aconteceu com a que trata da prostituição. O dinheiro dos Estados Unidos, que representa de 2% a 3% do programa, seria aplicado em ações com organizações não-governamentais (ONGs), de pesquisa e campanhas de uso do preservativo. O governo brasileiro, que paga 90% do programa, vai cobrir a parte da Usaid, caso, até setembro, a agência não desista de impor ao Brasil a exigência sobre evitar investir em tratamento para pessoas envolvidas com prostituição.

Segundo a reportagem do "Wall Street Journal", ONGs brasileiras que atuam em convênio com o Programa DST/Aids argumentam que não há motivos para mudar a orientação de um trabalho que vem tendo sucesso nos últimos dez anos e é reconhecido no exterior. Diz ainda o jornal que programas brasileiros lidam de maneira aberta com homossexuais, prostitutas e usuários de drogas injetáveis.