Título: `Nossa influência diminuiu muito¿
Autor: Eliane Oliveirae Cristiane Jungblut
Fonte: O Globo, 04/05/2005, O País, p. 11

Na visão de analistas políticos argentinos, um dos principais motivos que explicam a nova crise entre os governos do Brasil e da Argentina é a dificuldade do país de aceitar a perda de peso no cenário internacional e, paralelamente, o protagonismo assumido pelo Brasil. ¿Continuamos sendo a segunda economia da América do Sul, mas nossa influência diminuiu muito¿, disse ao GLOBO o analista político Rosendo Fraga, diretor do Centro de Estudos Nova Maioria.

Como o senhor explica a atual crise entre Brasil e Argentina?

ROSENDO FRAGA: Na minha opinião, esta nova crise tem três explicações: primeiro a História, depois o comércio e, por último a política interna argentina. Há um século, a Argentina representava 50% do PIB da América Latina e, hoje, representa apenas 8%. Neste sentido, a Argentina tem dificuldade de aceitar que o Brasil é um ator global e o país mais importante da região. Também custamos a aceitar que o Chile deixou de ser um país pequeno e passou a ser um país de peso. Enquanto isso, nós perdemos influência na região. Continuamos sendo a segunda economia da América do Sul, mas nossa influência diminuiu muito.

O fato de a secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, ter visitado recentemente Brasil e Chile, sem passar pela Argentina, incomodou o governo Kirchner...

FRAGA: Claro, foi o fato que nos marcou. A visita de Rice pode ter desencadeado a crise, mas o fator principal nesta crise é a História, a perda de peso da Argentina na região. Kirchner também ficou incomodado pela atitude do presidente Lula em relação à Venezuela e sua suposta intenção de atuar como mediador entre Chávez e os EUA.

Os conflitos comerciais também contribuíram?

FRAGA: Há dois anos, a Argentina acumula déficit comercial com o Brasil. É verdade que antes deste período negativo a Argentina teve vários anos de superávit comercial. Mas o atual déficit é um fato que não pode ser subestimado.

Existem também os interesses internos de Kirchner, as eleições legislativas de outubro, consideradas pelo presidente o principal teste eleitoral de seu governo...

FRAGA: Sim, o presidente acredita que atitudes de confronto no âmbito externo, seja uma briga com o FMI ou com o Brasil, ajudam a melhorar sua imagem interna e, com isso, a ganhar votos. A diferença entre um político e um estadista é que o estadista adota decisões pensando no longo prazo. Na minha opinião, Kirchner atua como político e não como estadista. ( J.F. )