Título: OEA: PERU E BOLÍVIA IMPEDEM CONSENSO
Autor: Jose Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 03/05/2005, O Mundo, p. 30
Discordância com Chile faz com que países, ao lado do México, não votem em novo secretário-geral
WASHINGTON. O objetivo era fazer com que o ministro do Interior do Chile, José Miguel Insulza, fosse eleito secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), ontem, por aclamação. No entanto, nem mesmo intensas reuniões de último hora, que provocaram um atraso de quase duas horas para o início da sessão, foram capazes de resultar no consenso que vinha sendo buscado por insistência dos Estados Unidos.
Por isso foi necessário realizar uma votação, vencida por Insulza ¿ candidato único ¿ mas com a exposição pública de fortes divergências de Bolívia e Peru. Sem contar que o México, cujo candidato (o chanceler Luis Ernesto Derbez) deixara a disputa às vésperas do evento, em nome da busca pelo consenso, solidarizou-se, em cima da hora, com aqueles dois países.
Insulza recebeu 31 votos e foram registradas as abstenções de Bolívia e México, mais o voto em branco do Peru. No final, a vitória do chileno ¿ que era apoiado por Brasil e Canadá, entre outros ¿ significou uma clara derrota dos EUA. Desde a fundação da OEA, em 1948, sempre venceram os candidatos que tinham o apoio do Tio Sam.
Candidatos dos EUA não conseguiram apoio
O próprio Insulza destacou a mudança de ares:
¿ Há algo novo agora. Até aqui o procedimento que seguíamos era que os EUA deixavam claro quem era o seu candidato, e desta vez trataram de buscar um consenso ¿ disse ele, depois de sua eleição.
Julia Sweig, especialista em política latino-americana do Council of Foreign Relations, de Nova York, comentou:
¿ Esse não foi um recuo gracioso dos EUA, mas trata-se de um movimento positivo. Essa é uma grande virada nas relações entre os Estados Unidos e a América Latina ¿ disse ela.
O governo americano apostara, primeiro, num candidato de El Salvador que acabou se retirando às vésperas da votação anterior, porque obtivera o apoio de apenas três países. Em seguida, o governo Bush colocou todas as suas fichas no mexicano Derbez. Cinco votações foram realizadas em 11 de abril, todas terminando com um empate de 17 a 17 entre Derbez e Insulza.
Dias atrás, alertada por Brasil e Colômbia de que o candidato mexicano não teria chances, pois outros países já tinham sido convencidos de que Insulza seria o melhor candidato, a secretária de Estado, Condoleezza Rice, empreendeu uma negociação que resultou na desistência do candidato mexicano, apoiado pelos EUA em nome de um consenso. Ontem, porém, a esperada unanimidade não surgiu.
O ministro de Relações Exteriores da Bolívia, Juan Ignacio Siles del Valle, disse que por razões históricas ¿ ¿que todos vocês conhecem¿ ¿ o seu país não apoiaria Insulza. Ele lembrou que a Bolívia perdeu para o Chile 120 mil quilômetros quadrados de território e 400 quilômetros de costa marítima durante a Guerra do Pacífico (1879-1883). E destacou que apesar de a OEA ter proposto 11 vezes uma negociação que desse à Bolívia o acesso ao oceano, o Chile jamais se dispôs a conversar sobre uma solução.
Em seguida, o embaixador do Peru na OEA, Alberto Borea Odría, disse que não podia apoiar o candidato de um país que em 1995, embora fosse o responsável pelo Tratado de Paz, Amizade e Limites do Rio de Janeiro, em vez de permanecer neutro ¿ durante um conflito entre o Peru e o Equador ¿ ¿entregou armas a uma das partes em disputa¿ (ao Equador).