Título: JURO ALTO É DESAFIO PARA ECONOMISTAS
Autor: Vagner Ricardo
Fonte: O Globo, 30/04/2005, Economia, p. 37

Gastos públicos elevados e 'spreads' bancários inibem queda das taxas

A redução das taxas de juros no Brasil é um desafio para os economistas, ainda sem resposta pronta. Foi o que mostrou ontem o seminário "Brasil, política monetária e de crédito - considerações sobre taxas de juros", organizado pela Associação dos Bancos do Estado do Rio (Aberj) e pelo Sindicato dos Bancos do Rio (Sberj). O país tem hoje juros reais (acima da inflação) de 13,3% ao ano, os mais altos do mundo.

- Muitos dirigentes passaram pelo Banco Central e, até hoje, nenhum conseguiu reduzir os juros reais para níveis considerados civilizados - afirmou, no evento, Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central (BC). - É um problema complexo e representa um desafio intelectual para a atual geração de economistas. Equivale em complexidade ao fenômeno da hiperinflação enfrentado pela minha geração.

Crédito consignado pode puxar taxas para baixo

Entre as propostas apresentadas estão a redução dos gastos públicos, a independência do Banco Central e o avanço do crédito consignado (com desconto em folha de pagamento), que tem taxas mais baixas. Os altos spreads bancários (diferença entre o custo de captação dos bancos e a taxa cobrada pelos clientes) são outro fator de encarecimento dos juros. Mas Roberto Troster, economista da Febraban, garante que a rentabilidade do setor, em torno de 21%, está próximo de outros segmentos econômicos mais fortes.

Ao lado dos gastos públicos, que subiram de 20% para 40% do PIB nos últimos anos, o economista Paulo Guedes apontou a poupança compulsória, feita via Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), FGTS, PIS e Pasep, como um dos fatores que encarecem o crédito:

- Não quero discutir se alguns segmentos merecem ou não receber financiamentos via poupança compulsória com juros menores. Mas é claro que seu fim produziria uma equalização dos juros, com a taxa subindo um pouco onde está muito baixa e reduzindo onde é muito elevada - disse ele.

Na avaliação do economista Márcio Garcia, professor do Departamento de Economia da PUC-Rio, o BC precisa manter os juros básicos elevados, puxando para cima a taxa paga pelo tomador final nos empréstimos, porque falta credibilidade à política monetária e há indexação remanescente dos preços. A credibilidade da política monetária, afirma, é afetada pelo temor de mudanças:

- Sabemos, por exemplo, o que o vice-presidente José Alencar pensa das taxas de juros. Imagine se, por qualquer motivo, ele assumisse a presidência?

Para economista, autonomia do BC também é importante

Para Gustavo Franco, as dúvidas e os prêmios de risco cobrados pelo mercado poderiam ser reduzidos se houvesse a autonomia do BC como instituição. Isso significaria mandato fixo para seu presidente, entre outras mudanças.

O diretor de Política Econômica do BC, Afonso Bevilaqua, disse que, apesar do ciclo recente de alta, a taxa básica de juros (Selic) mostra tendência de queda nos últimos anos.