Título: Cardeais criticam excesso de impostos e mínimo em missa e nota da CNBB
Autor: Elza Yuri Hattori e Heliana Frazão
Fonte: O Globo, 02/05/2005, O País, p. 4
Dom Cláudio Hummes diz que burocracia obriga empresas a informalidade
SÃO PAULO e SALVADOR. Os impostos, o desemprego e o novo valor do salário-mínimo foram criticados por líderes da Igreja Católica no Dia do Trabalho. Em São Paulo, o cardeal-arcebispo de São Paulo, Dom Cláudio Hummes, criticou o desemprego e o excesso de impostos no país, em sermão para cerca de duas mil pessoas que participaram ontem da missa comemorativa ao Dia do Trabalho realizada na Catedral da Sé. E em Salvador, o presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e cardeal-arcebispo de Salvador, Dom Geraldo Majella Agnelo, criticou o novo valor do salário-mínimo.
Dom Cláudio Hummes atribuiu o desemprego à falta de organização da sociedade.
¿ E isto é responsabilidade não só dos políticos, mas também dos trabalhadores. Pelo trabalho, podemos ganhar a vida sem depender da caridade dos outros. Temos mais capacidade e mais talento. Mas há muita gente na informalidade ¿ destacou Dom Cláudio, que afirmou também ser difícil abrir o próprio negócio para fugir da informalidade. ¿ Precisa-se enfrentar impostos pesados e a burocracia com exigências impossíveis de serem atendidas.
Durante o ato religioso, fiéis ligados à Pastoral Operária exibiam cartazes lembrando que somente em São Paulo existem hoje 1,75 milhão de desempregados. Uma carteira de trabalho gigante, onde se lia ¿carteira sem emprego e sem direitos¿ foi posta no altar junto com pequenos cartazes que pediam justiça, esperança, força e luta.
`Miséria e fome ainda imperam¿
Dom Geraldo Majella Agnelo enviou uma mensagem aos trabalhadores brasileiros pela passagem do 1º de Maio condenando o novo valor de R$300 do salário-mínimo e também a flexibilização das leis trabalhistas, a terceirização, o trabalho escravo e o infantil.
Ao ser perguntado se o reajuste do mínimo representava uma recomposição do poder de compra, o cardeal foi irônico
¿ Pergunte ao Severino (Cavalcanti) se daria para ele e os seus pares sobreviverem com esse valor. Todos eles querem ter salários cada vez maiores e aqueles que pouco têm que sobrevivam ¿ criticou.
Dom Geraldo disse que Lula pode até estar acertando com a política econômica, ¿mas em detrimento do trabalhador pobre e da geração de empregos¿.
¿ Alguma coisa tem sido feita, mas está muito longe do ideal que vai atender às necessidades e expectativas da nossa gente. A miséria e a fome ainda imperam ¿ disse.
Na mensagem aos trabalhadores, a CNBB destacou a discriminação de mulheres e afro-descendentes no mercado de trabalho e apontou o desemprego e o subemprego como chagas vivas no país.
A entidade fez referência ainda ao êxodo rural; aos riscos da emigração de brasileiros para o exterior, em busca de melhores condições de vida; ao tráfico de seres humanos para fins de exploração sexual; e ao clamor dos índios pela reconquista do seu território.
¿Tudo isso denunciamos como chagas profundamente dolorosas e reveladoras de um perigoso divórcio entre o trabalho, o emprego e a cidadania¿, diz a mensagem, que conclui lembrando que a ¿democracia não se realiza, de fato, quando o sistema econômico exclui parcelas da população.¿
* Especial para O GLOBO