Título: DEPUTADOS: CHACINA TERIA MOTIVAÇÃO POLÍTICA
Autor: Gustavo Goulart/Ana Cláudia
Fonte: O Globo, 06/05/2005, Rio, p. 14

De acordo com parlamentares, disputa entre coronéis da PM estaria por trás da matança

Dois deputados da Comissão de Direitos Humanos da Alerj afirmaram ontem de manhã, durante audiência pública com o secretário de Segurança, Marcelo Itagiba, que a chacina da Baixada foi motivada por uma disputa política na região. Tanto Paulo Mello (PMDB) como Paulo Ramos (PDT) - major reformado da PM - foram enfáticos ao dizer que os PMs acusados do assassinato de 29 pessoas em 31 de março eram ligados ao coronel da reserva Francisco D'Ambrósio, ex- comandante de Policiamento da Baixada. À tarde, Itagiba determinou que os delegados responsáveis pela investigação do caso convoquem Paulo Ramos para depor. O coronel D'Ambrósio negou a denúncia.

De acordo com Paulo Ramos, a causa da matança foi uma disputa entre D'Ambrósio e o inspetor-geral da Polícia, coronel João Carlos Ferreira. Segundo o parlamentar, D'Ambrósio já tinha delimitado seu território com interesses políticos e João Carlos mudou todo o comando da Baixada, ligado ao primeiro oficial, em troca de apoio político em 2006. O deputado disse ter apurado essa versão com fontes dentro da PM.

- A troca de comando gerou uma reação na tropa, especialmente na parcela que quis mostrar fidelidade ao D'Ambrósio. Eu não tenho qualquer dado para dizer que houve um dirigente na chacina. Mas havia um propósito, que seria desestabilizar os comandos na Baixada e a cúpula da segurança com finalidades eleitorais, o que é uma desgraça - disse o parlamentar.

Comissão da Alerj poderá chamar oficiais

Paulo Mello também disse acreditar que a mudança do comando e a saída de D'Ambrósio tenham motivado os crimes.

- Não acredito que as pessoas se reuniram de uma hora para outra para cometer aqueles crimes, sem uma orientação. Acho que agora apareceu uma testemunha dizendo que o crime foi motivado por uma briga, por uma disputa de comando na Baixada. Eles (os policiais acusados da chacina) eram do comando de D'Ambrósio na Baixada. Agora, uma testemunha se apresenta para dizer que ouviu daqueles policiais que eles queriam demarcar território para dizer quem mandava na região - ressaltou o deputado.

Ao ouvir a denúncia, durante a audiência marcada para falar sobre as investigações do caso, Itagiba disse que desconhecia essa versão. Segundo o secretário, no inquérito, a informação de que o objetivo dos criminosos era desestabilizar o comando da PM na região tem como única fonte uma testemunha, que diz ter ouvido isso de PMs num bar. À tarde, por meio da assessoria, Itagiba disse que não pode permitir que "questões políticas lancem nuvens de fumaça sobre as investigações e tumultuem a apuração desse crime hediondo". O chefe de Polícia Civil, Álvaro Lins, disse que é uma irresponsabilidade fazer uma denúncia sem provas.

- O inquérito é feito de dados e até agora os dados não indicam que a chacina tenha sido praticada em função de algum mandante ou de alguma disputa política. Se esses fatos surgirem, serão considerados na investigação - disse Itagiba.

Após a audiência, Paulo Ramos disse que vai conversar com os integrantes da comissão e analisar a possibilidade de convocar os coronéis João Carlos Ferreira e D'Ambrósio para prestar depoimento.

Atualmente secretário de Segurança de Belford Roxo, onde comanda 135 guardas municipais e 120 agentes da Defesa Civil, D'Ambrósio disse inicialmente que nada teria a declarar sobre a denúncia dos deputados estaduais. O oficial, no entanto, negou que tenha pretensões políticas e afirmou que não é filiado a qualquer partido:

- Não tenho interesse em ser candidato a nada. Estou satisfeito com minha atual função.

Ele disse ainda que foi para a reserva no ano passado após completar seis anos como coronel (uma norma na PM). Também afirmou que, durante todo o período à frente do Comando de Policiamento da Baixada, chefiou 2.500 homens sem dar privilégio a ninguém. Ele disse que está pronto a prestar depoimento se for intimado.

O coronel João Carlos Ferreira disse ontem que somente hoje falará sobre a denúncia apresentada na Alerj.

'Havia um propósito, que seria desestabilizar os comandos na Baixada e a cúpula da segurança'

PAULO RAMOS - Deputado estadual do PDT

Legenda da foto: OS DEPUTADOS PAULO Ramos e Paulo Melo e o secretário Marcelo Itagiba: audiência na Alerj sobre os rumos da investigação da chacina