Título: Tony Blair: `Entendi o recado dos eleitores¿
Autor: Fernando Duarte
Fonte: O Globo, 07/05/2005, O Mundo, p. 44

LONDRES. Com sua popularidade manchada por causa da invasão do Iraque e da aliança com George W. Bush, o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, contrastava ontem com a imagem da euforia que marcou sua chegada ao poder em 1997. Reeleito para um inédito terceiro mandato trabalhista consecutivo, Blair, num discurso na residência oficial de Downing Street, fez uma espécie de mea-culpa ao falar da guerra e pedir a união dos colegas de partido para o novo mandato.

Embora já tenha dito que pretende cumpri-lo até o fim, os rumores são de que as divisões entre os trabalhistas podem forçá-lo a deixar o governo antes mesmo de bater o recorde de permanência da conservadora Margaret Thatcher, primeira-ministra entre 1979 e 1990 e dona da maior longevidade no cargo desde o século XVIII.

¿ O Iraque foi um tema que dividiu os britânicos, mas acho que agora as pessoas querem seguir adiante. Escutei e entendi o recado que os eleitores me deram e o que esperam para esse novo mandato ¿ disse Blair, prometendo que vai se concentrar incansavelmente em assuntos como imigração e o restabelecimento da ordem pública.

Brown emplaca aliado em novo ministério

O premier celebrou ontem seu 52º aniversário em meio à confirmação de sua vitória nas eleições gerais do Reino Unido. Blair, no entanto, teve de se contentar com um presente não muito animador: apesar de o Partido Trabalhista ter vencido nas urnas, sua maioria no Parlamento britânico foi reduzida de 160 para 66 cadeiras.

Na prática, uma vantagem suficiente para os trabalhistas continuarem ditando os rumos do país, mas aparentemente insuficiente para garantir que Blair estará no timão, já que algumas rebeliões no partido no segundo mandato fizeram com que o premier suasse para aprovar decisões como a da reforma universitária.

Ainda mais porque o grande destaque trabalhista no pleito de quinta-feira foi ninguém menos do que Gordon Brown. O ministro das Finanças e principal rival de Blair no partido foi o único dos figurões do governo a ter registrado mais votos em 2005 do que nas eleições de 2001 ao garantir uma hegemonia de 22 anos no distrito de Kirkcaldy, na Escócia. Gente como o chanceler Jack Straw, o vice-primeiro-ministro John Prescott e o ex-ministro do Interior David Blunkett perderam votos na defesa de suas cadeiras, um reflexo interpretado com um protesto nas urnas contra a participação britânica na invasão do Iraque. Na madrugada de ontem, Brown não escondia a satisfação com o resultado que reforçará as pressões populares e políticas para que tome o lugar de Blair durante o terceiro mandato.

Por sinal, Brown já fez valer sua influência no novo Gabinete, anunciado ontem. Ele permanece na pasta das Finanças, assim como Jack Straw na de Relações Exteriores, e Charles Clarke no Ministério do Interior, mas emplacou o protegido Alan Johnson numa nova pasta, a de Produtividade, Energia e Indústria, cuja principal missão será estudar a reativação do programa nuclear britânico. A grande novidade, porém, foi a volta do ex-ministro do Interior David Blunkett, que renunciara em dezembro depois de usar influência para aprovar um visto de residência para a babá do filho de sua amante. Blunkett será o ministro do Trabalho e das Pensões. Outra mudança notada foi o rebaixamento do titular da Defesa, Geoff Hoon, criticadíssimo durante a guerra do Iraque, para o posto de líder do governo no Parlamento. O novo ministro é Peter Reid, que ocupava a Saúde.

Michael Howard vai deixar liderança dos conservadores

No geral, os trabalhistas conquistaram cerca de 36% dos votos válidos, o menor percentual já registrado numa vitória eleitoral com maioria no Reino Unido. O comparecimento às urnas foi de 61%, dois pontos percentuais maior que no último pleito. Uma surpresa foi o resultado dos conservadores, cujo índice de rejeição do eleitorado foi alto nas eleições de 1997 e 2001. Eles aumentaram sua presença no Parlamento em 31 cadeiras, a maioria perdida pelos trabalhistas.