Título: LULA: `JOGO POLÍTICO NÃO RESPEITA O SER HUMANO¿
Autor: Ricardo Galhardo
Fonte: O Globo, 07/05/2005, O País, p. 14

Presidente diz ainda que governo tucano foi negligente, doutrinário e provocou estagnação econômica do país

CAMPINAS. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem em Campinas que o jogo político muitas vezes privilegia interesses particulares e desrespeita os seres humanos. Lula fez a declaração durante o anúncio da reestruturação societária da Brasil Ferrovias, empresa privatizada no governo tucano responsável pela mais importante malha ferroviária do país, que estava abandonada.

Lula não poupou ataques ao antecessor, Fernando Henrique Cardoso. Sem citar o nome do ex-presidente, fez referências negativas aos anos 90. Num discurso com tom eleitoral, o presidente comparou os pontos positivos de seu governo com o do tucano. Lula começou reiterando que não deve fazer mudanças na área econômica por causa das eleições e criticou o processo político nacional:

¿ Não temos o direito de nos tornarmos seres menores. Muitas vezes o jogo político não respeita o ser humano, as mulheres, as crianças. Muitas vezes ele se dá apenas em função dos interesses menores de grupos ou de pessoas.

Governador de São Paulo ouve discurso em silêncio

Segundo Lula, as pressões políticas não desviarão o rumo do governo:

¿ O Brasil não pode mais permitir que uma eleição, nacional ou municipal, possa atrapalhar o roteiro de um projeto de desenvolvimento que possa transformar esta nação em uma nação definitivamente soberana e desenvolvida. Definitivamente, o Brasil entrou numa rota de desenvolvimento e de controle inflacionário. Em hipótese alguma deixaremos que isso deixe de acontecer porque um partido, um candidato ou uma pessoa tem um interesse que não é o da nação.

Depois, Lula se concentrou nos ataques indiretos ao governo tucano. Sentado ao lado do presidente, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), possível adversário de Lula em 2006, ouviu em silêncio.

¿ Reordenamos um processo de privatização que deixou à deriva um sistema de transporte indispensável num país continental como o Brasil ¿ afirmou o presidente.

Lula disse que o governo anterior foi negligente, doutrinário e provocou a estagnação econômica do país. Ele disse que o clima hoje é outro. Segundo Lula, a ¿lógica do cada um por si¿ da política econômica tucana provocou graves danos sociais:

¿ Temos que lembrar que, nos anos 90, o BNDES perdeu seu foco como banco de investimento ao mesmo tempo que a crise do estado desarticulava os mecanismos de coordenação e complementariedade na relação entre o setor público e privado. O país deixou de pensar em si mesmo como sistema econômico integrado. A lógica do cada um por si teve efeitos negativos em diferentes áreas mas foi sobretudo corrosiva no setor social e na infra-estrutura.

Fundo Monetário Internacional volta à tona

A década passada voltou à tona quando Lula abordou uma de suas prováveis bandeiras de campanha: o fim do acordo com o FMI:

¿ Criamos condições na economia para transferir plenamente para dentro de nosso país o poder de decisão sobre o nosso desenvolvimento. Fizemos uma transformação profunda principalmente se comparada à vulnerabilidade dos anos 90, quando o Brasil acumulava em média US$25 bilhões de déficit nas contas correntes ¿ atacou.

Lula chegou ao evento, em Campinas, com os ministros Ciro Gomes (Integração Nacional), Alfredo Nascimento (Transporte) e Ricardo Berzoini (Trabalho) num vagão do Expresso do Pantanal. Na porta, integrantes do movimento ¿Quem matou Toninho?¿ fizeram um protesto pedindo o cumprimento da promessa feita por Lula de pôr a Polícia Federal nas investigações sobre o assassinato do prefeito Antonio da Costa Santos, o Toninho, em setembro de 2001.