Título: Agir ou empurrar
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 08/05/2005, Panorama Político, p. 2

Está difícil de entender. Ouvem-se coisas contraditórias no governo sobre a perda das rédeas no Congresso. Para uns, a crise chegou ao limite e Lula terá de tomar uma atitude. Para outros, não há mais como recompor a maioria nem acham que isso é tão grave. Afinal, dizem, já não há matérias importantes para serem votadas, exceto a reforma tributária e a lei das agências reguladoras.

Daqui até a eleição, dizem ainda, o Congresso terá de ser levado em banho-maria, e as energias do governo drenadas para as realizações. Este segundo discurso é duplamente preocupante. Primeiro, porque vem de gente graduada e influente. Depois, porque revela um perigoso desdém pelo Poder Legislativo, embora não faltem exemplos de governos que naufragaram quando, surpreendidos pelas águas de uma crise, não encontraram terra sob os pés. Sustentação parlamentar, falando claro.

Os adeptos deste discurso minimizam todos os revezes que o governo tem sofrido desde o episódio que, no futuro ainda diremos com mais certeza, dividiu o governo Lula em duas fases: antes e depois da perda da presidência da Câmara. A rejeição da MP 232 em sua forma original? Nada grave, afinal fora do governo mesmo a iniciativa de corrigir a tabela do Imposto de Renda. As outras medidas, que aumentavam impostos, foram mal explicadas e acabaram enfrentando aquela dura campanha da oposição. A rejeição ao nome indicado pelo governo para presidir a ANP? Vingança do PMDB, por não ter emplacado um nome seu. E a derrota na escolha dos representantes da Câmara nos conselhos de controle externo do Judiciário e do Ministério Público? Isso não era uma questão de governo, nem deveria ser, dado o caráter pluralista destes órgãos. Bom discurso, mas se a oposição emplacou os seus, o significado disso é derrota. Até desculpa para uma eventual (e provável) derrota do candidato petista José Pimentel para uma vaga de ministro do TCU os governistas já têm: também é uma escolha dos partidos, não uma questão de governo.

Que mais pode acontecer? Está no Congresso a medida provisória do salário-mínimo e com a ajuda de Severino Cavalcanti, o líder pefelista Rodrigo Maia emplacou na relatoria o deputado André de Paula. O salário-mínimo de R$300 é o maior que Lula já conseguiu dar. E se a oposição consegue aprovar um valor maior? Tira a bandeira de Lula e ainda compromete as já combalidas contas do INSS.

Mas ainda que tudo isso fosse miudeza do armarinho político, vamos que haja uma crise internacional e o governo precise aprovar a toque de caixa um pacote 51 como aquele de Fernando Henrique. Hoje, estaria no mato sem cachorros.

Mas há a outra conversa que corre. A de que Lula já sentiu que a água da falta de coordenação chegou-lhe aos joelhos e está disposto a tomar providências. Sobra dela é o rumor de que o ministro Aldo Rebelo pode ser substituído e o de que José Dirceu (conversa que ele esconjura) retomará a coordenação política.

¿ O único homem que pode dar jeito nesta situação chama-se José Dirceu de Oliveira e Silva ¿ diz o líder do PT no Senado, Delcídio Amaral.

De sua parte, Dirceu diz que definitivamente seu negócio é coordenar as ações do governo e fazer com que as coisas aconteçam, sobretudo na área de infra-estrutura. Deixa claro que coordenará a montagem das alianças para a reeleição, mas que não falem em administração parlamentar. Acontece que estes são vasos comunicantes e, se a água entornar de um lado, derramará também na outra ponta.