Título: UNIDADE METROPOLITANA FICOU NO PASSADO
Autor: Maiá Menezes
Fonte: O Globo, 08/05/2005, Rio, p. 31
Falta de agência para cuidar dos interesses comuns na região prejudica os municípios, segundo especialistas
Os 20 municípios que formam a Região Metropolitana do estado - entre eles a cidade do Rio - têm muito em comum, menos as soluções para os problemas que compartilham, como falta de saneamento, saúde precária e transporte deficitário. Enquanto o governo de São Paulo enviou à sua Assembléia Legislativa, na semana passada, um projeto de lei criando uma agência para cuidar do desenvolvimento dos 39 municípios metropolitanos, no Rio essa união está no passado.
O único elo que havia na região, cujo PIB corresponde a 66% do PIB estadual, foi rompido em 1990: a Fundação para o Desenvolvimento da Região Metropolitana (Fundrem) foi extinta 15 anos depois de ter sido criada (logo após a fusão entre Rio e Guanabara). E a falta de um órgão que regule e coordene a relação entre os municípios prejudica a região, na opinião de especialistas e prefeitos.
O pesquisador Luiz Cezar de Queiroz Ribeiro, do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (Ippur) da UFRJ, sustenta que o potencial econômico dos 19 municípios fluminenses pode desaparecer sem a criação de um órgão de gestão e planejamento. Autor de um estudo sobre as 28 regiões metropolitanas do país, Luiz Cezar fez uma hierarquia das condições de cada uma delas, levando em conta indicadores econômicos. A do Rio está em segundo lugar, atrás apenas de São Paulo.
- O Rio tem relevo na economia nacional, mas isso vem acompanhado de desordem social e urbanística, por causa da falta de planejamento. Questões políticas impedem a união. Em quase todos os estados há órgãos metropolitanos. Mas o Rio não tem nada. Os municípios aqui competem uns com os outros - analisa Luiz Cezar, lembrando que a Constituição de 1988 deu ao governo estadual a atribuição de criar órgãos metropolitanos. - Os governos não têm interesse em montar as agências temendo fortalecer prefeitos ligados a outros blocos políticos. No Rio, isso está radicalizado pela fragmentação do estado entre o garotismo, o grupo do prefeito Cesar Maia e a força petista. É uma desgraça.
A vereadora Aspásia Camargo (PV) concorda que a criação do órgão desagrada aos governadores:
- Ficando a critério do estado, o parto é impossível. O caso de São Paulo é um milagre, cuja gestação durou quase uma década. Os governadores não gostam das agências porque tiram o poder deles - o poder arbitrário de ajudar os aliados.
Segundo a assessoria do Palácio Guanabara, a governadora Rosinha Garotinho incluiu a Região Metropolitana nas atribuições da Secretaria da Baixada Fluminense no começo de sua gestão. Mas a mudança ainda não foi suficiente para amenizar o clima de disputa política na região. A falta de entendimento com o estado levou o prefeito de Nova Iguaçu, Lindberg Faria (PT), a ganhar amparo nacional. Na próxima terça-feira, o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, anuncia, em Itaguaí, a criação do Conselho de Desenvolvimento Econômico da Baixada, em parceria com a Firjan. Presidente da Associação de Prefeitos da Baixada - que reúne 13 municípios - Lindberg afirma que a política impede a união:
- Sem esse planejamento, teremos aumento da miséria. O governo do estado não tem jeito. Com a criação desta agência, tentaremos enfrentar a atitude do estado. Problemas como saúde, saneamento e habitação interligam os municípios.
Cidades buscam juntas soluções para problemas
Iniciativa no saneamento pode se expandir para transportes e lixo
A busca por uma solução coletiva para o saneamento uniu o terceiro município mais populoso do estado (São Gonçalo), integrante da Região Metropolitana, a oito cidades vizinhas. Com a Lei 11.107, sancionada em 6 de abril, nas mãos, a prefeita de São Gonçalo, Aparecida Panisset, reuniu-se com o ministro das Cidades, Olívio Dutra, para tratar da instalação de um consórcio intermunicipal para o tratamento do esgoto. A lei autoriza os municípios a se unirem como empresa para gerirem os serviços. Hoje a atribuição para o tratamento do esgoto metropolitano é da Cedae, que, segundo a prefeita, não vem atuando no município. São Gonçalo tem hoje apenas 1,57% do esgoto tratado.
- Precisamos nos unir, até para fazermos pressão. Agora chegou a hora do grito. Município forte é estado forte - argumenta a prefeita.
A iniciativa poderá se expandir para áreas como transportes e tratamento de lixo, segundo o secretário de Fazenda de São Gonçalo, José Maria Machado Rodrigues.
Planejamento de transportes falha por falta de integração
O secretário estadual de Transportes, Augusto Ariston, reconhece que ainda não há, de fato, um órgão que divulgue e organize os planos de transporte para cada município. A iniciativa ainda é embrionária: a secretaria tem reunido prefeitos da Região Metropolitana para apresentar o Plano Diretor de Transportes Urbanos, já concluído pelo estado. Há duas semanas Ariston se reuniu com o secretário de Transportes do Rio, Arolde Oliveira.
- Não se pode fazer um planejamento de transporte para um município só. Tem que haver integração. Quando eu mexo num corredor viário, tenho que mexer dentro dos municípios também - diz Ariston.
O pesquisador Luiz Cezar de Queiroz Ribeiro afirma que iniciativas como a criação de consórcios resolvem problemas pontuais, mas são insuficientes para dar conta dos problemas de gestão e planejamento das áreas metropolitanas.
- Elas continuam sendo pólos econômicos nacionais e alvos de problemas de toda ordem: social, de segurança, meio ambiente. A crise social é mais aguda nas áreas metropolitanas por causa da concentração de população e da falta de estruturas que amorteçam as crises - avalia.
O economista Mauro Osório, ex-estagiário da Fundrem, lembra que o órgão funcionava mesmo com a estrutura degradada, comum aos órgãos estaduais. Ela começou a falhar quando as decisões de planejamento deixaram de ser aplicadas pelos municípios. Oficialmente, foi extinta no governo Leonel Brizola, em 1990.
- Hoje há uma desestruturação total. Seria fundamental o governo criar uma agência para a região - diz Mauro.