Título: SITUAÇÃO FISCAL DO PAÍS PIOROU, DIZ ECONOMISTA
Autor: Regina Alvarez
Fonte: O Globo, 08/05/2005, Economia, p. 37

Especialista em contas públicas alerta que despesas obrigatórias cresceram de 87,3% para 90% na gestão Lula

BRASÍLIA. O aumento das despesas obrigatórias do governo federal, a elevada carga tributária e o baixo nível de investimentos públicos formam uma combinação perversa que pode colocar em risco o ajuste das contas públicas, na visão do economista Raul Velloso. Esta avaliação será detalhada na palestra que fará amanhã no Fórum Nacional, organizado pelo ex-ministro do Planejamento João Paulo dos Reis Velloso.

Participante habitual do Fórum, Raul Velloso mostrará na apresentação deste ano que houve um agravamento do quadro das finanças públicas desde o último evento, o que pode pôr em dúvida a viabilidade do controle da dívida pública.

- Esse risco está colocado mesmo em épocas de paz (sem crises na economia), na medida em que certos gastos não financeiros correntes continuem crescendo na velocidade de tempos recentes - alerta o economista.

Velloso, que é especialista em contas públicas, comparou a execução dos Orçamentos de 2002 e 2004 e concluiu que as despesas obrigatórias passaram de 87,3% para 90% no governo Lula. As despesas obrigatórias são aquelas que o governo não tem como cortar. Incluem os gastos sociais e os benefícios previdenciários.

- A carga tributária está no limite suportável pela sociedade e os investimentos, no fundo do poço. Este ano, se mantida a projeção de gastos do governo, ficarão em apenas 0,44% do Produto Interno Bruto (PIB). Portanto, a receita não pode mais subir e os investimentos não podem cair. Se as despesas obrigatórias continuarem crescendo, será muito mais difícil garantir o ajuste fiscal - alerta.

Por seus cálculos, o peso dos benefícios assistenciais e subsidiados no total das despesas subiu de 20% para 22,1% no período. Esses benefícios cresceram 9,5% acima da variação do PIB, com destaque para a Bolsa-Família, que avançou 66,4%.

Efeito da alta do mínimo pode estar subestimado

Outra constatação é que as chamadas despesas discricionárias - aquelas que o governo pode cortar - caíram. Esses gastos, como proporção do PIB, recuaram 22,3% nos dois primeiros anos do governo Lula, o que também reduz, na prática, o espaço para o ajuste das contas públicas.

O economista analisou ainda as contas de 2005 e desconfia de que o efeito do aumento real do salário-mínimo pode estar subestimado na projeção de gastos com benefícios assistenciais e subsidiados. Isso só reforça o temor de que as despesas obrigatórias continuem a pressionar o Orçamento, reduzindo o espaço do superávit primário:

- A tendência revelada pelos números não é de aperto.

Velloso alerta para as dificuldades de acumular um superávit primário capaz de assegurar o cumprimento da meta global de 4,25% do PIB e manter a relação dívida/PIB em queda. No ano passado, o governo federal fechou as contas com um resultado equivalente a 2,81% do PIB, quando 2,5% já seriam suficientes para cumprir a meta. O resto do esforço é feito por estados, municípios e estatais. Este ano, a previsão até agora é de um superávit de 2,24% do PIB, o que estaria abaixo do esforço recomendável:

- Uma combinação de políticas de crédito e fiscal mais apertadas seria a melhor opção para combater a inflação e assegurar o crescimento.