Título: SOCIAL 'MADE IN BRAZIL' JÁ ESTÁ EM 37 PAÍSES
Autor: Flávia Oliveira
Fonte: O Globo, 08/05/2005, Economia, p. 38

Programas como Bolsa-Escola, Pastoral da Criança, CDI e Fome Zero são adotados em quatro continentes

Não é somente pela via do comércio que o Brasil aderiu à era global. Famoso pela dimensão continental e pela diversidade populacional, o país está ganhando o mundo com suas políticas sociais. Pelo menos 37 nações de quatro continentes (América, Europa, África e Ásia) já implementam, com sucesso, a tecnologia social made in Brazil. O Bolsa-Escola, que transfere renda para famílias que mantêm suas crianças na escola e foi lançado por aqui em 1995, inspirou programas semelhantes em dez nações. A Pastoral da Criança, uma rede de voluntários arregimentada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) para salvar crianças de até seis anos da desnutrição, está em 15 países: da Argentina ao Timor Leste, de Angola às Filipinas.

O que admira nesta globalização social é justamente o fato de os projetos tipo exportação não se restringirem às políticas de governo. Bolsa Família, Fome Zero e os programas de erradicação do trabalho infantil e combate à exploração sexual de crianças e adolescentes integram o cardápio de interesse dos estrangeiros tanto quanto iniciativas nascidas de ONGs ou mesmo de unidades locais de instituições multilaterais, como o Banco Mundial (Bird).

CDI não planejara a expansão internacional

Com seu modelo de gestão reconhecido em três dúzias de prêmios, a maioria internacionais, o Comitê para Democratização da Informática (CDI), do empreendedor social Rodrigo Baggio, já apresentou o mundo da computação a 600 mil alunos, 20% deles no exterior. De suas 964 escolas de informática e cidadania, 172 ficam fora do Brasil. No Chile, são 63 unidades; na Argentina, 43; e no México, 33.

- Temos um projeto fácil de ser replicado, autogerido e com forte impacto social. Isso fez o CDI, que nasceu no Rio, espalhar-se pelo Brasil e no exterior. Estamos em todos os estados brasileiros e em dez países, sem nunca termos planejado essa expansão - diz Baggio.

Foi com uma idéia também simples que a Pastoral da Criança conquistou o planeta. Duas décadas atrás, pelas mãos de Dom Geraldo Majella Agnelo, então arcebispo de Londrina, e da pediatra Zilda Arns, um projeto-piloto foi lançado em Florestópolis, município paranaense onde a mortalidade infantil chegava a 127 por mil nascidos vivos. Em 1997, a taxa caiu para 20 óbitos por mil.

Pastoral já atendeu a 40 mil crianças em Angola

A ação da Pastoral para combater a desnutrição está a cargo de voluntárias que recebem instruções sobre cuidados, higiene e alimentação de gestantes e crianças de zero a seis anos. Elas orientam as mães e, mensalmente, pesam os pequenos. De tão universal, o modelo seduziu missionários religiosos, autoridades e "ongueiros" mundo afora. No Brasil, apenas em 2004, as 249 mil voluntárias da Pastoral (nem todas católicas) acompanharam 1,8 milhão de crianças. Em países como Angola, 3.375 líderes cuidaram de 40.500 meninos e meninas.

- A última a entrar foi a Guatemala, onde 378 crianças são atendidas por 15 líderes - conta Vanderlúcia da Silva, assessora da Coordenação Nacional da Pastoral.

De Vigário Geral para Trinidad Tobago, o AfroReggae começa a engatinhar na exportação de projetos sociais. Mês passado, um grupo da ONG - que combina música, arte, educação e transformação social em áreas pobres - apresentou-se na pequena nação caribenha. A idéia é trocar experiências e, provavelmente, em pouco tempo semear mais esta ação social brasileira e carioca além das fronteiras.

Bolsa Família foi apresentado ao governo egípcio

Unicef, BID e Bird ajudam a divulgar programas no exterior

O Bolsa-Escola está completando uma década de Brasil festejando seu sucesso internacional. O programa, que surgiu com o então governador do Distrito Federal, Cristovam Buarque, expandiu-se para o exterior com a ONG Missão Criança, diz o secretário-executivo, Astral de Melo. No Brasil, foi incorporado em 2003 pelo Bolsa Família, atual carro-chefe das políticas oficiais para exportação. Recentemente, o ministro Patrus Ananias, do Desenvolvimento Social, apresentou-o ao governo egípcio. Argentina, Peru, Paquistão, África do Sul, Haiti e Guatemala também buscam inspiração em políticas públicas brasileiras.

- A diversidade regional, cultural e social nos dá uma vocação natural para a formulação de políticas. Não damos conta dos convites para apresentações - diz Márcia Lopes, secretária-executiva do ministério.

Os organismos multilaterais também são difusores (e formuladores) das políticas sociais. O Unicef, conta seu representante-adjunto no Brasil, Manuel Buvinich, apóia e divulga o Bolsa-Escola e a Pastoral da Criança. Wanda Engel, chefe da Divisão de Desenvolvimento Social do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), costuma apresentar a nações latino-americanas a aposentadoria rural como um bem-sucedido programa de redução de pobreza.

Vinod Thomas, diretor do Banco Mundial (Bird) no país, faz o mesmo. Ações desenvolvidas por sua equipe, como combate à pobreza rural no Nordeste e crédito fundiário, estão sendo copiadas ou adaptadas em Índia, China, Iraque e Afeganistão. (F.O.)