Título: JOGO DOS SETE ERROS
Autor: Helena Chagas
Fonte: O Globo, 09/05/2005, O País, p. 4

Ninguém agüenta mais esse filme, mas olha só a reprise aí: reaberta a temporada de caça a Aldo Rebelo, PT e aliados pedem a volta de José Dirceu à coordenação política, Lula nada faz, etc etc etc. O final desse episódio não se sabe qual é, mas dificilmente será feliz. A esta altura, trocar nomes não resolve. Nem Jesus Cristo, nomeado coordenador, daria jeito hoje na base governista.

As coisas só vão melhorar no Congresso no dia em que o presidente da República - que, no presidencialismo à brasileira, é quem tem de fato a caneta, o Diário Oficial, a autoridade e os votos - considerar a articulação política uma prioridade e botar a mão na massa. E evitando certos enganos que vêm sendo cometidos:

1. Não se pode confiar só na economia e no gogó: a política sempre pode estragar tudo - Por mais que Lula tenha confiança nos índices de popularidade e na ligação direta com as massas para se reeleger, é bom lembrar que, no nosso sistema eleitoral, a mediação dos partidos e políticos ainda é essencial. Sobretudo para evitar encrencas. Exemplo: aliados insatisfeitos no Congresso podem representar dificuldades de coligação, que, por sua vez, significam menos tempo na TV, menos palanques e, sobretudo, mais candidatos para puxar a eleição para o segundo turno.

2. Não adianta fingir que derrota não é derrota - Não resolve também, para o Planalto, tampar o sol com a peneira e dizer que não perdeu a indicação para o CNJ porque não trabalhou pelo candidato Sérgio Renault. Ou então afirmar que nem tomou conhecimento da reunião da executiva do PMDB que prorrogou os mandatos dos oposicionistas. Ou dizer que não recuou porque não tinha posição oficial sobre a verticalização. Ok, o governo não venceu essas paradas porque não entrou em campo. Mas é derrota, sim. Por W.O.

3. Verticalização: é palavrão, mas é importante - Realmente, é um assunto chatíssimo esse de discutir a obrigatoriedade de as alianças estaduais seguirem a coligação nacional para presidente da República. De fato, Lula tem mais o que fazer e tratar em seu gabinete. Os rumos da eleição do ano que vem - e, portanto, da sua reeleição - , porém, estão estreitamente ligados ao que acontecer com essa regrinha básica. Se cai a verticalização, o governo tem mais chances de levar fatias do PMDB ao palanque de Lula, ainda que sem coligação formal. Ao mesmo tempo, porém, a liberdade de coligações para os partidos pode multiplicar o número de candidatos a presidente.

4. Não se pode alimentar ilusões em relação ao PMDB - O PMDB cristianizou e abandonou no meio do caminho pelo menos dois candidatos a presidente da República, incluindo aí o Senhor Diretas, Ulysses Guimarães. Por que agora vai ser correto com Lula? Não está no seu DNA. Resumindo: formal ou informalmente, o PMDB chuta Garotinho, dá um fora nos tucanos e apóia a reeleição se, em 2006, Lula estiver em boa situação e com chance concreta de ganhar. Se não, nem toda a Esplanada dos Ministérios será capaz de evitar a traição.

5. Severino não é aliado e o PP não vai ficar com Lula em 2006 - A esta altura, depois de tantas, é possível que Lula já tenha aprendido: o PP não é partido da base e Severino não é seu aliado coisa nenhuma. O presidente da Câmara é unha e carne com Fernando Henrique. E o PP sabe que, em 2006, não haverá um só eleitor para entender como o partido centro-direita de Maluf terá ido parar na coligação petista. Não há jogo, o que não quer dizer que, com ministério ou segundos escalões - como no caso do PMDB - o Planalto não consiga arrefecer os ímpetos oposicionistas do partido no Congresso.

6. Agenda parlamentar não se esvazia - Mais uma ilusão que pode botar tudo a perder. Nos bastidores do Planalto, o discurso é de que, na impossibilidade de recompor a maioria governista na Câmara, a tática a seguir será esvaziar a agenda parlamentar - já que, de fato, não há mesmo tantos projetos imprescindíveis assim a serem votados até o fim do mandato. É um perigoso engano. Parlamentares, quando não têm o que fazer, inventam: CPIs, convocações de ministros e todo o tipo de dissabores para o governo.

7. Sem a caneta, nada feito - Ao deixar a reforma política em segundo plano e construir sua base nos moldes tradicionais, o governo do PT optou por um caminho sem volta. Agora, tem que fazer governo de coalizão com reforma ministerial, liberação de emendas e cumprimento de acordos para divisão de espaços com aliados. É triste, mas é assim.