Título: Kirchner reclamou de Palocci no jantar com Lula
Autor: Janaína Figueiredo
Fonte: O Globo, 12/05/2005, O País, p. 5

Presidente argentino diz que cobranças foram entendidas: `Não pode existir um país com indústrias e outros sem¿

BUENOS AIRES. A lista de reclamações feitas pelo presidente da Argentina, Néstor Kirchner, ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva na reunião realizada segunda-feira passada, na Granja do Torto, teve como principal protagonista o ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Segundo revelou ao GLOBO uma alta fonte do governo argentino, que participou do encontro, Kirchner criticou a falta de atenção dada por Palocci às questões vinculadas à Argentina e, sobretudo, às constantes queixas apresentadas pelo ministro da Economia argentino, Roberto Lavagna.

¿ Kirchner lamentou o fato de que Palocci muitas vezes sequer retorna os telefonemas de Lavagna. O diálogo entre ambos os ministros não é nada bom ¿ disse a fonte, que pediu para não ser identificada.

De acordo com a fonte, durante a reunião com o presidente argentino Lula telefonou a Palocci para pedir explicações sobre o assunto.

¿ O presidente Lula ficou muito surpreso e na hora ligou para Palocci. Foi então que marcaram uma reunião entre Lavagna e o ministro brasileiro para o dia seguinte (terça-feira passada) ¿ afirmou a fonte argentina.

Apesar das reclamações, Kirchner se diz satisfeito

No encontro de segunda-feira, o governo argentino lamentou o fato de que Lavagna, que comanda as negociações comerciais com o Brasil, não tenha um interlocutor de peso no governo Lula:

¿ Kirchner disse a Lula que o diálogo entre os dois ministros é fundamental. Segundo comentou o presidente argentino, nos últimos meses Palocci não retornou pelo menos dez telefonemas de Lavagna.

Durante o encontro com Palocci, Lavagna entregou uma nova proposta para equilibrar o comércio bilateral (a Argentina acumula 22 meses de déficit comercial com o Brasil) e, sobretudo, o fluxo de investimentos na região. A Argentina, que hoje recebe apenas 10% dos investimentos estrangeiros injetados no Cone Sul, pretende recuperar o terreno perdido nos últimos anos e, para isso, espera contar com a solidariedade do Brasil. O ministro argentino apresentara uma primeira proposta em setembro de 2004, mas até hoje os dois governos não conseguiram chegar a um acordo.

¿ Lavagna continua cético, mas depois do puxão de orelhas de Lula ficou mais otimista ¿ afirmou o funcionário.

Ontem, um dia depois de retornar ao país, o presidente Kirchner disse que Lula entendeu com toda clareza que ¿não pode existir na América do Sul um país com indústrias (leia-se o Brasil) e outros países sem indústrias¿.

¿ As assimetrias com o Brasil são grandes, a economia brasileira é três vezes maior do que a nossa. Mas Lula reconheceu que existem assimetrias e nós analisamos a possibilidade de gerar ações em conjunto para consolidar o Mercosul ¿ enfatizou o presidente argentino, satisfeito com o encontro em Brasília.

Kirchner reconheceu que seria ¿irresponsável querer discutir sobre lideranças com o Brasil¿ e assegurou que para os argentinos ¿o importante é reconstruir o país¿. O presidente reiterou que sua decisão de antecipar a volta a Buenos Aires esteve vinculada apenas a questões de agenda.

¿ Tive duas reuniões com Lula. Os objetivos já estavam cumpridos ¿ argumentou.