Título: ECONOMISTA CONTESTA AFIRMAÇÃO DO GOVERNO SOBRE ALTA DE GASTOS SOCIAIS
Autor: Aguinaldo Novo
Fonte: O Globo, 12/05/2005, Economia, p. 26

Marcio Pochmann diz que, com crescimento e inflação, despesas caíram

SÃO PAULO. O forte aperto orçamentário para atingir as metas de superávit primário produziu uma redução de 8,31% dos gastos sociais do governo entre 2001 (ainda durante a administração Fernando Henrique Cardoso) e 2004, o que em valores atualizados pelo IGP-Di corresponderia hoje a R$9,9 bilhões. Esta quantia equivale, por exemplo, a quase o dobro dos recursos destinados no ano passado ao Bolsa Família (de R$5,8 bilhões), um dos projetos prioritários do governo Lula.

Este é o resultado de um estudo divulgado ontem pelo economista Marcio Pochmann, da Unicamp, para contestar os dados apresentados na semana passada pelo Ministério da Fazenda. Mensurados em relação ao PIB, os dados da equipe econômica apontaram para um aumento dos gastos sociais no período de 2001 a 2004, porém sem efeito direto na diminuição das desigualdades sociais no país. A culpa por isso, segundo o relatório oficial, seria da alta das despesas previdenciárias (um dos itens que compõem o chamado Orçamento Social).

Pochmann contesta a conclusão da Fazenda, dizendo que não se levou em conta a variação da inflação no período, nem o aumento da população.

- A Fazenda usou dados nominais, contrariando o que tem sido feito por organismos internacionais. É estranho falar em gastos sociais e não considerar, por exemplo, o crescimento da população - atacou o economista, que foi secretário da ex-prefeita Marta Suplicy (PT) em São Paulo.

Pochmann diz que usou a mesma metodologia usada pela Fazenda, só incluiu na conta o registro da inflação e da população. Pelas suas contas, o gasto social direto (com Previdência, Saúde, Educação e Habitação e Saneamento, entre outros) caiu 3,16%, para um valor de R$897,34 per capita em 2004 - contra R$926,65 em 2001. No segmento de Habitação e Saneamento, a queda teria chegado a 55,55%.

Maior prejuízo para população de baixa renda

O estudo de Pochmann reconhece, porém, que há um crescimento dos gastos sociais per capita, de um ano para outro: passando de R$807,51 em 2002, no primeiro ano do governo Lula, para R$872,92, em 2003, e R$897,34 no ano seguintes. Mas Pochmann insiste que este crescimento não reforça a tese do secretário de Política Econômica, Marcos Lisboa (que deixará o governo), no início do mês. Para o economista, há um viés anti-social na atual política econômica.

Segundo ele, o prejuízo dos brasileiros de baixa renda pode ser ainda maior do que aqueles R$9,9 bilhões. Pochmann fala em uma combinação perversa, ao cruzar o que o governo teria deixado de investir no social com a redução da participação do rendimento do trabalho na renda nacional.

Ainda considerando o período de 2001 a 2004, enquanto o PIB apresentou variação de 7,6%, o rendimento do trabalho avançou apenas 4,5%. Essa diferença representaria, a preços de hoje, R$19,3 bilhões.

- Em vez de considerações ligeiras e superficiais, muitas delas sem consistência real e que apontam para conclusões equivocadas, como a condenação do gasto social no Brasil, a equipe principal do Ministério da Fazenda deveria analisar melhor a sua própria contribuição ao aumento da dívida social, sobretudo no que diz respeito ao aprofundamento da desigualdade da renda - disse.