Título: Aliança floresceu no ABC
Autor: José Casado
Fonte: O Globo, 15/05/2005, O Mundo, p. 38
A associação de interesses do empresariado com os do regime militar floresceu no golpe de 1964 e se intensificou a partir de 1968, assentada na poeira da construção das indústrias ¿modernas¿ no ABC paulista e sobre a lápide política imposta pelo Ato Institucional nº 5 (AI-5).
Já era hábito tratar reivindicações trabalhistas como caso de polícia, observa o historiador João Guilherme Vargas Neto. O primeiro fichário da polícia política em São Paulo, lembra, foi montado a partir de uma lista negra entregue por Jorge Street, que presidiu o Centro Industrial do Brasil (antecessor da Confederação Nacional da Indústria) entre 1912 e 1926.
A aliança empresarial com os órgãos de repressão política ganhou escala e eficácia a partir de 1969. Pelos nove anos seguintes não se registrou a ocorrência de greves nas grandes indústrias.
¿- Foi muito forte essa conexão com a ditadura militar, comenta Vargas Neto. ¿ Usaram até o imposto sindical para financiar o aparelho repressivo. Da contribuição sindical compulsória, naquela época, 20% eram retidos pelo Ministério do Trabalho na conta ¿Salário-Emprego¿. Daí saíram recursos para coisas como compras de C-14, as Veraneio da GM, muito usadas pela polícia.
Advogado dos metalúrgicos do ABC nos anos 70 e ministro do Trabalho de 1985 a 1990, Almir Pazzianotto complementa:
¿ Diziam que as empresas financiavam o Esquadrão da Morte (do delegado do Dops Sérgio Paranhos Fleury) com o dinheiro do rateio das contribuições sindicais. Mas o fato é que nunca foi feita uma auditagem na conta Salário-Emprego.
Como reivindicação trabalhista era problema automaticamente transferido da sala da diretoria para a delegacia de polícia, foi com naturalidade que o plantonista do Dops em São Bernardo do Campo recebeu Sílvio de Oliveira, da Resil S/A, no dia 27 de junho de 1978.
Às 16h15m pôs um ponto final no relatório de 26 linhas, nas quais torturou o idioma: ¿A direção da empresa introduziu entre seus empregados três elementos com a finalidade de os informarem e localizarem os mentores do movimento grevista. (...) Outrossim, esclarecemos que de acordo com a situação a simples retirada de circulação do (empregado) Antonio dos Santos tornar-se-ia possível o conhecimento de outros implicados ou mentores intelectuais¿.
Na última sexta-feira, um dos proprietários da Resil S/A, Claudio Sachs, pediu a assessores para informar que ¿estranha e desconhece¿ o envolvimento da sua indústria com a repressão política. Segundo ele, a Resil sempre manteve um ambiente ¿democrático e respeitoso¿ e Sílvio de Oliveira, ex-funcionário, nunca teve autonomia para falar em nome da empresa. (José Casado)