Título: EX-CANDIDATO DENUNCIA COMPRA DE VOTOS
Autor: Toni Marques e Lydia Medeiros
Fonte: O Globo, 16/05/2005, O País, p. 3

Testemunha afirma que participou de reuniões com Garotinho para acertar a fraude

Uma testemunha revelou ao GLOBO detalhes de como funcionou o esquema de compra de votos em Campos nas últimas eleições. Jocinaldo Elias da Silva, de 40 anos, o Naldinho, disse ter pago a eleitores com dinheiro fornecido pelo PMDB, partido presidido no Rio pelo ex-governador e secretário de Governo, Anthony Garotinho. Naldinho foi candidato a vereador pelo PL, partido que compôs a base de apoio ao candidato do PMDB a prefeito do município, Geraldo Pudim.

A testemunha diz ter participado de duas reuniões presididas por Garotinho no Clube de Diretores Lojistas (CDL) de Campos, antes da eleição. Uma delas no primeiro turno quando, segundo ele, foi acertado o valor a ser pago por cada voto.

¿ Eu sei que o dinheiro apareceu em Campos, da mesma forma que aquele dinheiro apareceu na sede do PMDB. Eu sei que o dinheiro vinha para nossas mãos. Mas de onde vinha, eu não sei te falar ¿ disse Naldinho.

Pagamento a eleitores era feito na rua

Pudim, Garotinho, a governadora Rosinha Garotinho, o prefeito Carlos Alberto Campista (PDT) e mais três pessoas tiveram os direitos políticos cassados por decisão da juíza da 76ª Zona Eleitoral (Campos), Denise Appolinária, na última sexta-feira.

¿ Eu consegui, no segundo turno, das cinco da tarde até as seis e meia, pagar uma faixa de 300 a 330 pessoas, aqui na frente da minha casa. Eu fazia na frente porque não queria fazer dentro de casa. A polícia já veio aqui duas vezes pra me pegar. Uma vez, entrei dentro do mato com o dinheiro nas mãos e dentro da roupa, atravessei a BR-101 e fui parar do outro lado. No segundo turno eu paguei o pessoal na rua, para evitar problema. As pessoas recebiam e iam embora ¿ disse Naldinho.

Ele guarda 200 comprovantes de votação que, segundo ele, documentam o esquema de compra de votos. Os comprovantes teriam sido entregues por eleitores depois do segundo turno. Naldinho diz ter ficado com o material porque não recebeu parte do dinheiro que deveria ter sido usado para pagar a eleitores.

¿ No segundo turno eles nos forçaram a pegar aquele comprovante do título, que quando a gente vota dão para a gente. Eu estou com 200 aqui, só que não entreguei para eles. Eu segurei. Eles não me pagaram, ficaram me devendo uma quantia de dinheiro pra mim e pro pessoal que trabalhou. Depois da eleição, na segunda-feira, eu fui lá para ver se o dinheiro tinha vindo e me disseram que não iam mais pagar ¿ diz Naldinho, calculando que deixou de receber de R$25 mil a R$30 mil que seriam usados na compra de votos.

Alimentos dois dias antes do segundo turno

O ex-candidato guardou ainda cadastros do Cheque Cidadão (programa do governo do estado) feitos por ele no primeiro e no segundo turnos. As cestas básicas do Instituto Visão ¿ do qual o presidente regional do PMDB, Anthony Garotinho, é integrante ¿ também foram usadas para pagar aos eleitores. Na falta do dinheiro prometido, Naldinho diz ter distribuído 300 cestas básicas, três dias depois da eleição. Segundo ele, a orientação que recebeu da coordenação da campanha era de que os alimentos fossem distribuídos dois dias antes do segundo turno.

¿ Eles me prometeram emprego no estado e agora estou em má situação com a minha família, com aluguel atrasado, tudo atrasado. Eles me deixaram na mão. E eu não sou moleque deles. Por isso eu resolvi denunciar ¿ afirmou Naldinho. Ele procurou o GLOBO dizendo que decidiu denunciar o esquema porque não conseguiu ver cumprida a promessa de emprego depois da frustrada a campanha para vereador.

No processo que resultou na inelegibilidade do casal Garotinho e de mais cinco políticos de Campos, a juíza Denise Appolinária cita uma testemunha que conta que o pagamento de R$50 aos eleitores de Geraldo Pudim se daria em uma praça, logo após o término das eleições. A testemunha havia sido presa em companhia de um homem identificado como Davi Francisco dos Santos, que tentava votar por outra pessoa.

Procurado pelo GLOBO ontem, Garotinho não foi encontrado.