Título: Vidigal de novo em guerra
Autor: Cristiane de Cássia, Fernanda Pontes e Luiz Ernest
Fonte: O Globo, 18/10/2004, Rio, p. 10

Aguerra do tráfico voltou a tomar conta do Vidigal neste fim de semana. Em menos de 24 horas, três pessoas morreram e outra ficou ferida durante confrontos entre quadrilhas no morro. À noite, a Polícia Militar chegou a fechar durante uma hora e meia a entrada da Avenida João Goulart, principal acesso à favela, provocando congestionamento na Avenida Niemeyer até o Leblon. Quase 200 pessoas esperaram na parte de baixo a situação se acalmar antes de irem para suas casas.

Segundo policiais do 23 BPM (Leblon), traficantes da Rocinha teriam invadido o Vidigal na madrugada de ontem, provocando um racha no comando do tráfico. Por volta das 21h30m, um veículo blindado do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da PM entrou na favela durante operação do 23 BPM, que contou ainda com o apoio do Grupamento Especial Tático-Móvel e Batalhão de Choque.

Uma das vítimas da nova guerra foi Antônio Francisco da Silva, irmão do ex-chefe do tráfico do Vidigal Ailton Francisco da Silva, que foi assassinado recentemente junto com quatro cúmplices a mando do traficante Eugênio Santos da Costa, o Lyon. Antônio foi morto na noite de ontem e seu outro irmão Alex Francisco da Silva, de 26 anos, levou um tiro no braço e na mão.

O confronto começou na noite de sábado, com um intenso tiroteio que durou cerca de 15 minutos. Fiscal da cooperativa que tem 40 mototaxistas que atuam na favela, Jarbas da Silva Santos, de 25 anos, foi assassinado. Segundo a polícia, ele teria sido morto por não aceitar pagar pedágio aos traficantes. Jarbas controlava o aluguel das motos cobrando diárias entre R$ 20 e R$ 35. R$ Já Adriano Maria de Lima, de 25 anos, suspeito de ter envolvimento com o tráfico, teria sido executado por traficantes na madrugada de ontem.

Comércio na favela fechou o dia todo

O comércio do Vidigal permaneceu fechado ontem e poucos mototaxistas trabalharam. Cerca de 40 policiais do 23 BPM (Leblon), do Grupamento Tático-Móvel (Getam) e do Batalhão de Choque ocuparam a favela. À noite, uma nova troca de tiros assustou os moradores e a PM fechou a entrada principal da favela.

Durante a tarde, policiais disseram que a guerra teria recomeçado porque traficantes da Rocinha teriam invadido o Vidigal na madrugada de ontem. Com isso, o alto do morro do teria passado a ser dominado por uma facção criminosa rival da que domina a parte baixa da favela, provocando uma guerra entre quadrilhas.

O comandante do 23 BPM, Renato Fialho, negou, no entanto, que o Vidigal tivesse sido invadido por traficantes da Rocinha.

¿ Todos os meus policiais que estão local dizem que a situação está tranqüila. Se há alguém de facção rival no morro, está sorrateiramente tentando cumprir algum objetivo específico. Não há indícios de tentativa de invasão ¿ disse o comandante por volta das 20h40m, quando a entrada da favela ainda estava fechada.

De acordo com policiais, os traficantes do Vidigal têm procurado ganhar dinheiro na favela fora das bocas-de-fumo. Além do ágio sobre a venda de botijões de gás, que já foi noticiado e tem sido combatido pela polícia, os bandidos estariam cobrando pedágio de mototaxistas e motoristas de Kombis que circulam pela comunidade, e até estacionamento dos moradores.

O serviço reservado recebeu informações de que o mototaxista assassinado não quis pagar uma quantia e foi morto. O pai dele também estaria desaparecido. Ainda de acordo com informações que estão sendo apuradas pelos policiais do 23 BPM, a ordem para matar o mototaxista teria partido do traficante Patrick Salgado de Souza Martins, preso em Bangu III.

Uma segunda versão apontava Jarbas como responsável pela cobrança de aluguéis de motos na favela. A diária custaria de R$ 20 a R$ 35.

As carcaças de duas Kombis queimadas também foram encontradas ontem de manhã na entrada do Vidigal. Elas eram usadas no transporte de passageiros pela favela.

Cerca de 20 pessoas, entre mulheres, adolescentes e crianças, estiveram no fim da manhã na porta do 23 BPM reclamando que, no meio da confusão, foram expulsas de suas casas, na localidade conhecida como Vinte e Cinco. Elas acreditam que os bandidos que as expulsaram vieram da Rocinha.

¿ Eles chegaram quando amanhecia, às 6h, arrombaram a porta e ameaçaram estuprar minha filha de 13 anos se a gente não saísse de casa. Tivemos que sair correndo, não deu tempo nem de pegar uma fralda para o meu bebê ¿ contou uma moradora.

Um oficial recebeu as famílias no batalhão. Ele ordenou que policiais as acompanhassem até suas casas. COLABORARAM Daniel Engelbrecht e Rodrigo March